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Fi-lo porque qui-lo
Jânio Quadros
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“Não lhe conhecia esta capacidade de
aceleração para o precipício”, disse Carvalho da Silva à TSF, a
respeito de António Costa. Eu confesso que também não. Mas suponho que deve ser
esse mesmo o lastro da social-democracia: a súmula de indecisões
tíbias, premeditações torpes, trapalhadas e todo o género de cegadas mais ou
menos sórdidas, equívocas ou anedóticas que robustecem o descrédito
generalizado que é a base sólida para o triunfo do fascismo. É dos livros de
História (veja-se a mui leda e social-democrata “governança” da Alemanha
nos anos que precederam a ascensão do nazismo e, mais recentemente da Itália,
nas temporadas que anteciparam o triunfo da senhora Melloni). Carvalho da
Silva, ainda na mesma entrevista, ressalva até, nesse mesmo sentido, “um conjunto de indicadores que já vêm da legislatura
anterior”.
Um dos indicadores indisfarçados dessa tendência
tornou-se bastamente notório na última proposta de orçamento de estado do
governo da geringonça. A ideia era, como sempre, meter o
socialismo na gaveta e fechá-lo à chave, mas desta vez deitar fora a chave. Os
comunas, como sempre, chutaram para canto, tal com os do Bloco. Mas a
grande maioria dos portugueses, com o barulho das luzes, aplaudiu, como
as focas, em alegre apoteose.
Quando Costa, com a bênção não menos
entusiasmada da associação patronal, conquista a maioria absoluta, já só tem
uma ideia fixa: destruir e desmoralizar os serviços públicos, e o
estado-social, a favor da privataria e da alta-finança. Foi para isso
que, com um notável esmero, arregimentou o elenco que constituiu o seu gabinete
e todo um governo cuja acção, numa sucessão trágico-cómica de improbidades
e parlapatices, é bem capaz de desacreditar por muitos anos qualquer ideia de
poder minimamente à esquerda.
Uma das estrelas mais cotadas do cast,
no desempenho deste burlesco entremez, é o ex-ministro da Defesa, e actual
ministro dos estrangeiros, João Gomes Cravinho. Filho do
nepotismo, perdão, de outro Cravinho, um garboso e mui seráfico paladino da
luta contra a corrupção que também já retratei aqui, João Gomes é um
diplomata e professor universitário com um interesse muito mais do
que puramente académico nos negócios imobiliários. Também é muito distraído –
nunca se apercebeu, por exemplo, que o seu sócio na imobiliária foi condenado
por fraude fiscal.
João Gomes é um
prato cheio para a oposição e para a opinião pública, e publicada. Quase tão
desastrado como o Cabrita (sobre quem também já me debrucei aqui)
Cravinho, como ministro da Defesa, trocou as mãos plos pés a propósito do
atraso na construção de um hospital militar sob sua tutela, e os pés plas mãos
para explicar a derrapagem aparatosa nos custos.
Como ministro dos estrangeiros, além de
fazer habitualmente o que não deve, Cravinho também diz invariavelmente tudo o
que lhe vem à cabeça, o que não deixa de ser, no mínimo, muito peculiar
num diplomata. João Gomes Cravinho disse, por exemplo, que os casos de
indisciplina na Armada “são intoleráveis, põem em causa o próprio país”
- mas não disse nada sobre o estado de sucata a que deixou chegar a frota da gloriosa
armada luzitana quando foi ministro da Defesa. João Gomes também
nada disse sobre a intolerabilidade da intrigante, inaudita e
destrambelhada renovação da sua própria carta de condução, o que não deixa de
ser uma lástima.
Todavia, Cravinho, além de ter sido o primeiro
a declarar guerra à Rússia, também já disse que Portugal até pode deter o
senhor Putin, se por acaso ele cá vier em recreio, ou assim. O que prova
que a formiga tem catarro, uma notável capacidade de aceleração para
o precipício e absolutamente nenhum medo do ridículo.
*Este é mais um retrato cantinflesco. Da
série iniciada e explicada aqui.
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4 comentários:
Grande merda de mandantes que temos.
Quando é que nos vamos livrar desta gentalha?
Muito bom!
É isso mesmo!
Esta gentalha que todos os dias nos envergonha como povo!
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