domingo, 1 de outubro de 2023
terça-feira, 26 de setembro de 2023
Albuquerque, as rosas e o pã
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Miguel Albuquerque é Presidente do Governo Regional da Madeira desde 2015. Acaba de ser reeleito, se a memória não me falha, pela terceira vez consecutiva. Albuquerque é daquele género de políticos, como Isaltino de Morais, que agradam às mais amplas maiorias. As pessoas acham-lhes um piadão.
Sujeito com muitos predicados, além de advogado, floricultor e criador de rosas (e nessa qualidade, membro da Royal National Rose Society, da The World Federation of Rose Societies e da American Rose Society) Albuquerque também é suspeito num processo-crime por corrupção, participação económica em negócio e prevaricação, para além da eventual violação das regras comunitárias em matéria de adjudicação. A investigação foi aberta em 2019, no Funchal. Em causa está a eventual relação entre negócios privados imobiliários de Miguel Albuquerque e o ajuste directo da concessão da Zona Franca da Madeira ao Grupo Pestana. Em 17 de março de 2021, na sequência de uma denúncia anónima, vários serviços do Governo da Madeira foram alvo de buscas, estando em causa “factos susceptíveis de integrar a prática de crimes de prevaricação, corrupção e participação económica em negócio”. Elementos da PJ e do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) realizaram também, a 13 de maio de 2021 buscas nas instalações do Governo da Madeira, no âmbito do concurso relativo à ligação marítima entre o Funchal e Portimão, confirmou o executivo regional”.
Outro dos predicados que faz dele um político tão do goto popular é a sua capacidade, admirável, de dar o dito por não-dito. As pessoas que votam como jogam no totobola, pondo a cruz naquele que acham que tem mais probabilidade de vencer, adoram políticos assim. Sentem que também ganham quando eles vencem. É tudo psicológico, claro. Mas eles não se importam.
Porém, além de tudo isto Albuquerque também é um homem de sorte. E algum engenho, convenhamos: mesmo quando não logra a vitória eleitoral absoluta, Miguel tem artes de logo encontrar um partido, pequenino e prestável, que se põe a jeito para a garantir. Em menos de vinte e quatro horas achou o Pã. Ele não é esquisito. Além da plítica, do poder, das rosas e do imobiliário, Albuquerque gosta de toda a bicharada.
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- toda a informação a respeito do curriculum de Miguel Albuquerque foi retirada, ipsis verbis, do seu verbete na wikipedia, ao qual apenas me permiti corrigir o infame ortografês em que vem redigido.
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segunda-feira, 25 de setembro de 2023
Rasgar novos horizontes
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Sábado, 23 de Setembro. 07h28 da manhã.
Algures, por detrás das dunas, a Figueira da Foz. Ao fundo, no horizonte, divisa-se a Serra da Boa-Viagem e à esquerda, para lá do se vê, adivinha-se o Cabo Mondego (foto tirada da porta das Urgências do Hospital Distrital onde estive, desde as 04h00, acompanhando uma pessoa muito próxima num fim-de-semana alucinante que só acabou segunda-feira ao meio-dia).
O Hospital parece não gostar muito de senhoras (não tem ginecologia) nem de fedelhos, pois também não tem Maternidade. Alguém, que parece padecer agudamente de uma estirpe mórbida de misoginia e de pedofobia, acha que não é preciso. Ah, e a urgência de urologia mais próxima também fica em Coimbra.
Enfim, nada que melindre demasiado os figueirenses e as figueirensas porque agora a cidade vai ser dotada de uma “nova entrada”. O “jornal” As Beiras diz mesmo que é para “rasgar novos horizontes”.
Quanto a mim, “que alegria quando me disseram”, também estou desvanecido. E já empolgado, claro, com as futuras obras de rasgação dos novos horizontes, e isso. Só peço a suaxelência o presidente da Câmara Municipal, e ao júri do concurso internacional de ideias, que a “nova entrada” da Figueira não perca valências (como o hospital) e preserve os mesmos dois sentidos. Assim como assim, que mantenha plo menos também a serventia de saída - das ambulâncias para Coimbra; e de nós-outros, todos, para qualquer dos azimutes dos horizontes rasgados.
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terça-feira, 19 de setembro de 2023
domingo, 17 de setembro de 2023
Fernando Botero (1932-2023)
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Lo que me interesa no son los seres, sino la manera en que sus volúmenes se inscriben en el espacio. Veo la vida en volúmenes.
Fernando Botero
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sexta-feira, 15 de setembro de 2023
Camilo e os (des)encantos do Porto patarata
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O Eclesiastes, no cap. 1º, falava profeticamente do meu Porto, quando escreveu: o número dos tolos é infinito.
Camilo Castelo Branco
A propósito da telenovela da remoção do monumento a Camilo, o mínimo que se pode dizer é que os portuenses actuais esforçam-se como nunca para merecer a opinião que deles tinha o genial escritor.
Quanto à minha opinião sobre o monumento de que tanto se fala, escrevi-a aqui, em 2016, numa pequena crónica a propósito de uma viagem ao Porto.
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quarta-feira, 13 de setembro de 2023
Do desenho, e da cor local
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Maiorca, 13 de setembro de 2023.
7.45h. Sol nascente.
Vista do meu sítio, a paisagem é toda minha
(vai-se fazendo - como um desenho - de hesitações, arrependimentos, acasos e achados ou inspirações).
Mas as cores não
- são todas (já) do Outono.
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sábado, 9 de setembro de 2023
Da justiça em Portugal
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Então foi assim.
Em 2021, por decisão, do Conselho Superior de Magistratura, Orlando Nascimento, presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, foi suspenso de funções por cento e vinte dias, sem vencimento.
Foi também em 2021 que o mesmo orlandíssimo juiz fez um pedido para voltar a analisar processos na mesmíssima Relação de Lisboa, algo que foi aceite pela presidente deste Tribunal, Guilhermina de Freitas. Assim, para efeitos práticos, este orlandíssimo magistrado continuou em funções.
Acontece que, em Setembro de 2023, o Supremo Tribunal de Justiça, considerando que a alegada infracção disciplinar aplicada ao orlandíssimo juiz estaria prescrita, anulou a decisão do Conselho Superior de Magistratura que, por sua vez, tratou de explicar os efeitos práticos da decisão ao jornal Público, dando-lhe conta de que “tendo sido já cumprida a decisão aplicada”, será “reposta a remuneração”.
Se me acompanharam até aqui, terão entendido, como eu, que o orlandíssimo magistrado Nascimento tem estado a analisar processos na Relação de Lisboa desde 2021 sem ser remunerado.
É de relembrar que o orlandíssimo foi suspenso de funções por 120 dias sem remuneração por, alegadamente (deve-se sempre sublinhar alegadamente) ter estado envolvido na distribuição irregular de processos judiciais no Tribunal da Relação de Lisboa e por - também alegadamente, claro - ter cedido, de forma abusiva, o Salão Nobre desse mesmo Tribunal para julgamentos privados.
Vistos os autos, decidi fazer-lhe um retrato. Fica aqui (entre nós, claro). Mas poderia ser pendurado na Relação de Lisboa. Ou até, porque não? no Supremo Tribunal de Justiça. Para memória futura.
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sábado, 2 de setembro de 2023
A estrela da tarde e o grau zero da política
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30 de Agosto, Quarta-Feira, pla tardinha. Tive o equívoco e tenebroso privilégio de, desprevenido, sonolento e boquiaberto, ser confrontado em directo com o espectáculo escabroso da descida do jornalismo ao nível mais rasteiro e da política ao ponto mais vácuo. O momento zen do jornalismo-de-merda e o grau zero absoluto da política. No mesmo instante e lugar. Na SIC-Notícias. Teresa Dimas recebeu Santana Lopes. Mas vamos por partes.
A SIC-Notícias é um canal de televisão por cabo que pertence ao empório de entretenimento do Grupo Impresa, detido por um conhecido oligarca da comunicação.
Teresa Dimas é a jornalista-âncora, a apresentadeira das notícias da tarde no canal. Dimas é uma vedeta do género. Tem tudo para agradar à vasta audiência do canal. Ela é a estrela-da-tarde - tudo nela é suave, doce, familiar, caloroso, redondinho, jovial, amável, luminoso. Salvo quando diz “Putin”, “Rússia”, “comunista”, “esquerda”, “Lula da Silva”, “extrema-esquerda” ou mesmo só ”trabalhadores”, “greve” ou “Papa Francisco”. Aí, tudo nela obscurece: o côncavo convexa, as covinhas achatam-se, os lábios fazem biquinho, o olhar ensombrece, as sobrancelhas circunflexam, o redondo agudiza-se, a jovialidade agresta, a doçura azeda, a amabilidade agrava-se, o calor fica gelado, o suave torna-se cortante. É com esta invulgar capacidade histriónica, aliada a uma inegável empatia, que ela, mui capciosa e habilidosamente, ajuda os espectadores a apreenderem a sua visão do mundo, a sua interpretação da notícia. A sua expressão, trejeitos e alguns àpartes funcionam, para quem assiste em casa, como aquelas placas que, exibidas ao público mercenário de certos espectáculos televisivos, indicam o momento imperativo para rir ou aplaudir (o método pode parecer muito menos grosseiro porque tudo se processa no campo subtil do não-dito - do subliminar - mas não o é, de todo, nem sequer menos degradante ou indecoroso). Teresa Dimas é uma espécie de flautista de Hamelin. Mas não são ratos quem ela encanta, manipula e conduz. É a opinião pública. Não toda, evidentemente. Apenas aquela, incauta, ingénua ou distraída, que se senta pla tardinha a ver televisão (para outros segmentos do horário a estação tem outros especialistas - divas e virtuosi - todos igualmente competentes nas suas especialidades).
Estais a gostar do filme?
- Pois é agora é que vai começar a acção. E entrar o artista convidado. Santana Lopes. O presidente da Câmara Municipal da Figueira da Foz já está sentado em frente de Teresa nos estúdios do canal. Veio de propósito da Figueira a Carnaxide a meio da semana para ser entrevistado. Está catita. Muito distinto. Fato completo, com colete. Cinza claro. A condizer com o cabelo, que lhe escorre húmido da nuca em farripas prateadas. Teresa está visivelmente encantada, voz de seda, tom receptivo, confidencial, aveludado. Pairam flores e violinos. Passam poucos minutos das sete em ponto da tarde. Santana está que nem pode, nota-se. Não é todos os dias que o presidente da Câmara da Figueira da Foz vai falar em directo a uma televisão nacional. É agora, pensei eu, incauto, que ele vai finalmente pôr a Figueira no trombone, quero dizer no mapa, ou na agenda oláoquié, é agora. É agora, pensei eu ainda, leonor pla verdura, que ele vai chamar os ministros e os secretários de estado pelos nomes, agarrá-los pelos cornos, ou plas orelhas, e dizer-lhes tudo, exigir-lhes a maternidade de volta, e a linha do Oeste e a da Beira-Alta e as oficinas da CP, mais um têgêvê para Salamanca, uma ponte nova sobre o Mondego e um aeroporto internacional, um porto oceânico e o bacalhau a pataco eu sei lá, é agora.
Qual quê. Santana começa a falar. E o que ouço é um chorrilho de banalidades a respeito do grande assunto do momento, as presidenciais - espoletado pelo pequeno Marques Mendes que, no seu pugrama de conversas em família, na SIC aos Domingos depois do telejornal, terá dado o tiro de partida da corrida a Belém, lançando-se como candidato. A dois anos e meio de distância mas decerto com aprovação e alto-patrocínio do oligarca dono da estação.
Mas que raio é que disse o Santana?, perguntais vós.
Nada. Zero. Nada de jeito. Pelo menos com interesse para quem realmente lhe paga, que são os figueirenses. E muito, imenso, das presidenciais; que não, não é candidato, ainda é muito cedo (o que significa que ainda pode vir a ser); depois dissertou filosoficamente sobre os poderes putativamente exagerados do presidente e tal, do taimingue das proposituras, dos outros putativos candidatos (todos muito boas pessoas, conhece-os a todos de pequeninos) mas sobretudo muito, imenso, e muito bem, de si próprio - o assunto favorito de alguém que nunca teve uma única ideia política mas sempre padeceu de uma compulsão mórbida para a competição sôfrega numa vida reduzida desde há muito a um abstruso e paroquial concurso de popularidade.
Quanto a Teresa Dimas, a única confissão que lhe arrancou foi qualquer coisa como ”só consigo pensar nisso”, a propósito das presidenciais, imediatamente corrigido, entre risinhos cúmplices, por um “bem, no intervalo dos meus afazeres na Câmara Municipal”. Também não lhe interessava mais nada e conseguiu-o: não descartou de todo mais um palhaço para o circo das presidenciais que o seu grupo de comunicação e entretenimento está a criar para poder vender anúncios a toda a casta de seguros, apostas desportivas, laxantes, empréstimos ao consumo, anti-depressivos, sabonetes, iogurtes, automóveis, perfumes, anti-diarreicos, detergentes, chocolates, anti-vomitativos e supermercados. Que a vida está difícil.
O jornalismo-de-merda e o puro-entretenimento são bastante dispendiosos - divas como a Dimas e pequenos comentadores com grandes ambições como Marques Mendes não devem ficar nada baratos. Não sei como é que na Figueira, mesmo com uma taxa turística a dois euros, eles conseguem.
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quarta-feira, 23 de agosto de 2023
quarta-feira, 16 de agosto de 2023
segunda-feira, 14 de agosto de 2023
Uma ideia peregrina com caminho para andar
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A nova ponte ciclopedonal que liga os concelhos de Lisboa e Loures, sobre o rio Trancão, na zona oriental da cidade, vai chamar-se Ponte Cardeal Dom Manuel Clemente.
A ideia (um verdadeiro achado, diga-se) foi da autoria exclusiva da mente privilegiada de Carlos Moedas, o coninhas com voz de velha que é o alcaide da Mouraria. Segundo a câmara de Lisboa, o nome da ponte foi comunicado ao presidente da autarquia de Loures, Ricardo Leão (essa coisa também esperta que me permiti retratar acima) que considerou, muito solícito, tratar-se de "uma boa opção e um justo reconhecimento".
O Cardeal Dom Manuel Clemente, já agora, é aquele estafermo que já retratei aqui por ter sido o mui clemente protector e conivente facilitador da deveras prolixa e continuada actividade pedófila na sua confraria.
Mas como estou hoje invulgarmente bem disposto, não me apraz gastar adjectivos com a padralhada em geral e com este bandalho em particular.
Além disto, e apesar de eu ser contra (até já assinei uma petição com esse teor) até considero que, de certo modo, um modo assaz retorcido, a ideia peregrina de dar a uma ponte o nome de um facilitador faz algum sentido simsenhor: um sentido único, e sórdido.
Visto isto e mais actos, se a ideia for consumada, o que me apraz mesmo é congratular desde já todos os munícipes de Lisboa e de Loures, porque a merecem – e também porque sabem escolher com tão exigente critério e visível entusiasmo autarcas com ideias tão espertas.
O que provará, receio, que o triunfo das grandes ideias de merda deve tanto ao voluntarismo criativo do seu autor idiota como ao arrebatamento conivente e velhaco dos idiotas que lhe estão próximos - mas também ao entusiasmo passivo, ou mórbido, de toda uma vasta quantidade de idiotas anónimos.
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sexta-feira, 4 de agosto de 2023
Moedas, trocado em miúdos
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O homem auto-satisfeito desconhece o vexame
Lao Tse
Carlos Moedas é um fenómeno. Apesar de nunca ter sido reeleito, o autarca de Lisboa exibe a mesma pose seráfica, de contentinho de si-próprio, cheio de vento e abençoado por nossosenhor, que outros portentos da mesma área política repetidamente empoderados pelo sempre imarcescível, indulgente ou cúmplice, favor popular – como em Oeiras Isaltino de Morais ou Santana Lopes na Figueira da Foz.
Todavia, além da pose, Moedinhas também pratica fluentemente, sobretudo como este último, o mesmo discurso melífluo, piedoso e paternalista, lânguidamente bafiento, paroquial e reaccionário - mas com a vantagem de o fazer com voz de cana rachada. De maneiras que, “ouvisto” por detrás, pola frente e de ambos lados, Moedas parece sempre uma velha. Faz as almas pequenas. Também faz lembrar o Doutor Salazar, outro portento político que, não desfazendo, também foi imensamente abençoado por nossosenhor na sua época, e ainda hoje, por um basto eleitorado conservador.
Para o eleitorado conservador aliás, como é sabido, todo o futuro é invariavelmente inquietante porque, para esta brava gente, por princípio, tudo o que é novo é desconhecido e, como tal, sempre ameaçador. Portantos deve ser por isso (por já lhes soar familiar) que o que Moedas, e a sua voz esganiçada, representam - para todos, na velha, e na nova, direita portugueza – é muito mais do que uma simples promessa. Trata-se de uma verdadeira esprança, muito plausível, quase uma garantia, de um futuro tão suficientemente tranquilizador e aprazível como o passado que tanto prezam.
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domingo, 30 de julho de 2023
O merchandaizingue da coisa
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Vivemos, de novo, tempos idolátricos. Outra vez tempos aziagos para quem não se conforma com a sandice, aquela velha atitude filosófica que consiste em aceitar com entusiasmo explicações que não exigem entendimento. A idade-média está de volta. Com pífaros e pandeiretas. São tempos áureos para o obscurantismo fanático e rancoroso. A santíssima religião não só é, de novo, muito respeitável, como até se recomenda.
Em Portugal, as únicas vozes que se manifestam com alguma racionalidade e que ainda vão fazendo algum eco nos media dominantes - os meios da comunicação comercial - são, como na idade média, os bobos – quero dizer, os artistas, aqueles que são mais facilmente desacreditáveis.
Bordalo II, por exemplo - que ousou dizer em público que acha perverso que “depois de sabermos dos abusos sexuais na Igreja, o Estado seja patrocinador deste festival católico” - viu o inefável e infalível Polígrafo comprovar que ele é, afinal, um dos mais felizes contemplados pelo estado com ajustes directos.
É claro que, depois disto, o artista já está a assar nas redes sociais - o bom povo que come gelados com a testa também gosta muito de fogueiras e não sabe, nem quer saber, das condições de vida dos artistas nem das contingências da arte e de outras paneleirices. Este bom-povo, que crê sem entender num só deus dividido em três pessoas, na virgindade de uma senhora que é ali de Fátima e uma vez pariu um moço e até numa porção de santinhos de todos os géneros e lugares, também não quer saber, nem entender, certos conceitos muito simples e até alguns factos da vida – como, por exemplo, este: ninguém adquire uma certa obra de arte a um determinado artista por concurso público; pla simples razão que qualquer aquisição dessa obra exacta a esse artista específico é sempre - só pode ser, não existe outro modo - um ajuste directo. Os artistas, tal como outros profissionais da vida airada, como as putas por exemplo, vivemos de ajustes directos. Sabemos (um saber de experiência feito) que a vida é “cu no chão, dinheiro na mão”, caso contrário o mais provável é ficarmos a arder para sempre. Sei que isto dito assim sem eufemismos pode ofender os mais altos sentimentos do bom-povo e até de alguns burgueses, a quem peço desde já, humildemente, que se fodam.
Mas mudemos de assunto, que isto está a tornar-se demasiado pessoal. Em todo o caso, bastamente constrangedor.
Enfim, como a nova prioridade nacional, anunciada por todos os órgãos da informação empresarial, é agora a sacrossanta segurança do recinto e não a putativa e amoral perversidade de um subsídio público descarado a uma multinacional pedófila (e ao seu franchaisingue nacional) eu, como não se pode ir contra eles, decidi juntar-me a eles. E conceder-lhes, também eu, porque não?, um subsídio, na forma do consultingue na área do merchandaizingue.
Sabia que as Jornadas Mundiais da Juventude tinham logotipo e grande, imensa, e graciosa, cobertura mediática, mas não tinham, nem têm, uma mascote. Um bonequinho. Como o Gil da expo 98 ou o Kinas do Euro 2004. Por isso lembrei-me daqueles fradinhos das Caldas, com um cordel para puxar, que se vendiam antigamente nas feiras para gáudio do bom-povo que sempre viu com particular e cúmplice bonomia os fulgores da líbido fradesca. Também me ocorreu que todo o santo clero português deve andar, compreensivelmente aliás, xitadíssimo por estes dias – enfim, com tanta juventude a flanar por aí, nas Jornadas Mundiais que estão quasiquasi a começar.
E foi então que criei o Zé. O Padre Zé. Ou melhor, o Padzé. Que melhor mascote do que este simpático bonequinho para realmente encarnar todo o espírito da coisa? Vender-se-ia como pãezinhos quentes, entre os peregrinos e até entre os basbaques. Em objecto, de louça ou de peluche, com barbante, claro; mas até mesmo só em postal.
Fica a ideia. É grátis.
(Depois não digam que isto aqui é só dzer mal e mainada, sem contributos construtivos e assim).
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