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quinta-feira, 20 de outubro de 2016

O outono, no meu jardim

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Os jardins também se desenham. 
Embora não seja nenhum Le Nôtre (não sou obcecado pela simetria e pela grandiloquência) também sei usar um cordel e escolher as espécies; mas gosto mais de observar, aproveitando os acasos.

O esplendor do meu jardim (se assim lhe posso chamar) é no Outono. 
É quando o desenho mais acentua os contrastes cambiantes e as cores explodem entre as sombras. É uma alegria breve, bem sei. Trata-se de uma beleza funesta, perecível. Sobressaltos de prazer em pequenas sensações (mais aqui). Puro deleite para contemplativos dados à reflexão. 
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quinta-feira, 3 de setembro de 2015

o rangel do texas

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Não gosto do gesto repetitivo que de rotineiro se torna redundante. Por isso, neste meu labor de caricaturista amador não é meu hábito desenhar mais do que uma visão do mesmo personagem. Embora amiúde lhes corrija os pormenores, cada um dos meus desenhos tenta, com o menor número possível de traços, consubstanciar o meu parecer definitivo sobre o personagem em questão.
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Não há, contudo, regra sem excepção.
Há casos em que o desenho tem que acompanhar as metamorfoses de personagens cujo aspecto exterior vive em perpétua transformação. Assim, o desenho é obrigado – sob a ameaça de (supremo malogro de uma caricatura) se ver irreconhecível - a acompanhar-lhes a alteração dos traços e dos adereços: enquanto incham ou desincham, rapam as barbas ou deixam crescer os bigodes.
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É este o caso de Paulo Rangel. 
Ao contrário de pensadores que fazem realmente pensar (como Eduardo Lourenço, Agostinho da Silva, Viriato Soromenho Marques ou José Gil), Rangel é um daqueles pensadores que de cada vez que abre a boca só provoca o riso ou, mais provavelmente, o vómito.
Segundo a sua inefável e complacente visão de si próprio, Rangel orgulha-se da sua escola, diz que gosta de escrever (já engendrou mais livros do que filhos) mas que a vida pô-lo a falar; que se morresse amanhã ainda seria feliz e que depois, acrescenta candidamente, não sabe. Trata-se de um inacreditável auto-retrato satisfeito de um autêntico piça d’aço do pensamento mentecapto; de corpo inteiro. Só visto, aqui.
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Eu já o tinha retratado aqui, com outro aspecto, a propósito de outra das suas manifestações alvares. Agora porém, apesar de ter desinchado e de ter deixado crescer a barbela, continua a dizer merda. Desta vez em Castelo de Vide, na universidade de Verão do seu partido (a lusapenas do pêpêdê), resolveu esganiçar umas papaias a respeito de qualquer coisa relacionada com as aventuras da justiça no maravilhoso país do alterne que é o nosso.
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Foi a oportunidade para lhe aggiornar o retrato. O meu parecer continua o mesmo; apenas actualizei os traços ao seu aspecto exterior mutante. Rangel continua, afinal, igual a si próprio.
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quinta-feira, 27 de agosto de 2015

retrato da presunção, sem água benta

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Joseph Conrad escreveu, não sei bem em que contexto, que a caricatura é “pôr o rosto de uma piada no corpo de uma verdade”. 
Como Conrad não foi propriamente um espírito conhecido pela nonchalance, deduzo que a sua referência tenha sido crítica. Na sua austera severidade (ele não usava de rodriguinhos nem paninhos quentes, escarafunchava a chaga sempre até à carne viva), a caricatura sugeria-lhe um expediente artificioso - uma espécie de máscara - com que se tentaria disfarçar a face sempre inquietante desse corpo hediondo que é a verdade; ou seja, um divertimento mundano, irresponsável e escapista, apenas destinado a amenizar a dura realidade dos factos da vida.
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Penso que não é esse o caso das minhas caricaturas. Detesto o engraçadismo tanto como Conrad. O que busco nos meus desenhos (que não são “bonecos” apalhaçados pra fazer rir) não é a fácil adesão ou o entretenimento pelo riso alarve. O que neles é exagero ou parece deformação é apenas o que me parece conveniente realçar pelo desenho em vista de uma melhor apreensão da pura e dura realidade dos factos da vida.
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Ontem fiz 53 anos. Cinquenta e três. Já não tenho grande futuro. O país em que habito também não. Isto é um facto da vida. A dura realidade. A verdade.
Tenho vindo a dedicar-me à árdua e bastante desconsiderada arte da caricatura, desenhando, entre outros, os rostos de uma classe dirigente que reduziu velhacamente a esperança de um povo imbecil a este grau zero e lhe transformou a vida nesta comédia negra triste e bufa pontuada alegremente - de Maio a Outubro em Fátima e de Agosto a Junho no canal Benfica – por estranhos fervores colectivos e álacres festividades populares.  E, entre a época dos fogos, a balnear e a da sardinha, por outras delirantes e pícaras bizarrias, como a caça aos indecisos, os inumeráveis e repetitivos festivais de música ao ar livre e as privatizações a mata-cavalos.
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O rosto que escolhi retratar e editar hoje aqui é o de Sérgio Monteiro, o secretário de estado das infraestruturas, transportes e comunicações. Na prática trata-se do comissário plenipotenciário dos donos-disto-tudo para as privatizações. O senhor suápe. É dele o rosto da privataria - essa curiosa transacção de bens públicos para bolsos privados a preços módicos convencionados pelo mediador em troca de equívocas percentagens ou futuras participações.
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Os traços, a pose e a retórica são as de quem encara essa sale besogne como uma missão. Algo realmente importante. Patriótico. O mediador acha-se um decisor.
É disso que trata o desenho. De presunção. O retrato - tanto quanto possível fiel, ainda que resumido ou sintético - de um alarve entupido de auto-convencimento.


A caricatura, como a entendo, não ambiciona fazer rir. Embora, por vias travessas, talvez até o faça.
A verdade é que, como Camilo a respeito do romance, também “estou mais que muito desconfiado de que não morigera nem desmoraliza”.
Apenas procura, modestamente, aquela inquietação que só proporciona o verdadeiro entendimento dos factos da vida. 
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sábado, 18 de outubro de 2014

Zé Oliveira

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A cooperativa Trevim, da Louzã, está a comemorar o 47º aniversário do seu jornal “Trevim” e o 30º do “Bronkit”, o seu suplemento humorístico.
Integrada nas comemorações consta uma homenagem ao caricaturista Zé Oliveira e também ao seu personagem “o Broncas”, nascido nas páginas do Bronkit.

No passado dia 4 foi inaugurada uma exposição com uma retrospectiva dos 30 anos do Broncas e com 30 desenhos de homenagem realizados por 30 artistas amigos.

Hoje, dia 18, (pelas 15h, no Museu Etnografico Dr. Louzã Henriques) será lançado um álbum com esses desenhos - assim como um Bronkit especial.

Para Osvaldo Macedo de Sousa, grande conhecedor do humor gráfico em Portugal, o Broncas é uma espécie de zé-povinho – “um pobre mas atento serrano com coragem para dizer o que pensa”.

Instado por Osvaldo, que comissariou a exposição, não quis deixar de participar nessa justíssima homenagem. Enviei o desenho acima. Foi o que me ocorreu para dizer o que penso do grande Zé Oliveira. 
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sábado, 6 de setembro de 2014

do sentido do desenho

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Um poema que não te ajude a viver e não saiba preparar-te para a morte
não tem sentido: é um pobre chocalho de palavras
João Guimarães Rosa
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Os ultimos dias têm sido pródigos em notícias da incessante actividade (para cima e para baixo) dos mais lídimos representantes do filhodaputismo nacional; mas a verdade é que a  já lhes fiz o retrato a todos:
-para cima, tal aliás como previ aqui, foi o ex-secretário Rosalino e aqui o ex-secretário Moedas;
-para baixo (por enquanto, pelo menos até ao recurso) foi o sucateiro Godinho (aqui) e o seu compinska Vara (aqui) que transumavam entre si fumeiro transmontano e influências por robalos e pão-de-ló;
- para o ar (ou para a puta que o pariu) haveria de ir, e explodir por lá, o inenarrável Durão Barroso, esse autêntico balão de merda que desenhei aqui.
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O desenho é, assim, uma actividade que me absorve toda a atenção. Confesso contudo que, ao contrário da maior parte das pessoas, eu não faço rabiscos; sou incapaz de desenhar enquanto falo ao telefone, enquanto espero, ou simplesmente para matar o tempo. Sou também, por exemplo, incapaz de o fazer em público, como agora está em voga entre muitos dos meus colegas (a verdade é que abomino a atitude de uma certa leviandade inerente a esse género de exibicionismo).
Não gosto do gesto indulgente, do traço volúvel, da intenção vaga, da atitude imprecisa. O desenho, como cosa mentale, não se compadece, em mim, com as distracções do mundanal ruído; exige-me, além do intelecto desperto, todos os sentidos atentos e disponíveis, algum recato e uma certa solidão.
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Tal como o grande Guimarães Rosa a respeito do poema, considero que um desenho (mesmo um desenho de humor, uma caricatura) que não te ajude a viver e não saiba preparar-te para a morte não tem sentido: é um pobre feixe de rabiscos.
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domingo, 20 de abril de 2014

os meios reduzidos

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Então é assim:
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Afinal é simples.
-" Le dessin c'est une peinture avec des moyens reduits".
Voilá.
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terça-feira, 4 de março de 2014

O mistério do carnaval

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O carnaval pode ser bem mais do que a imbecilidade ridícula e triste que alguns mirones lúbricos gostam de apreciar da berma da avenida, de guarda-chuva e agasalho alarve, em todos os santos fevereiros húmidos, gelados e ventosos deste país merdoso do hemisfério norte.
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Pode ser, por exemplo, o que a minha filha fez com uma simples máscara de papel prensado (99 cêntimos, na loja dos chineses) e uma caneta preta:
- uma maravilha - de imaginação, humor delicado e meticulosa paciência; e um mistério - nunca pára de me espantar, a minha pequena.
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Ao alto: máscara de carnaval – Carolina Campos, Fevereiro 2014
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sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Do humor e suas intenções

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O objectivo de uma piada não é degradar o ser humano, 
mas lembrar que ele já é degradado
 George Orwell
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“Analisar o humor, terá dito Elwyn Brooks White, um dos nomes mais antigos da revista “The New Yorker”, “é como dissecar uma rã. Poucas pessoas se mostram interessadas e no fim a rã morre”. A frase é certeira e não é difícil demonstrá-lo: nada tem menos graça do que ter de explicar uma graça.” (daqui)
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Vem isto a propósito de um curioso comentário ao meu boneco do Eusébio e, em termos mais gerais, a propósito das interpretações de um desenho que escapam às intenções do seu autor.
É preciso ressalvar que o desenho é uma convenção. Utiliza uma série de códigos mais ou menos estilizados que se tornam inteligíveis porque foram convencionados entre o artista e o público – por exemplo, dois simples traços curvos num papel sugerem uma ave no firmamento, um traço vertical encimado por um círculo pode sugerir uma árvore, etc. – as pessoas aceitam e entendem estes sinais embora saibam (pelo menos as mais inteligentes) que o mundo representado pelo desenho não é assim.
Isto ainda é mais verdade no desenho de humor, na caricatura. Aqui nada é, nunca, literal - nem o traço, nem a cor.
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As coisas escapam porém, amiúde, ao controle de quem as cria - a criatura ao criador, a arte ao artista. O significado último ou definitivo de uma obra não depende do seu criador, mas do observador. O ónus da interpretação cabe sempre a quem observa - à sua sensibilidade e mundivisão. Por vezes há tantas interpretações e significados quantos os observadores. Sobretudo em terrenos movediços como o da Arte (neste capítulo aliás, as obras de fascínio mais duradouro são aquelas que escapam a qualquer entendimento ou interpretação - como a Gioconda ou As Meninas ou qualquer coisa de Vermeer ou de di Chirico, por exemplo) ou como o do Humor, onde as obras mais fascinantes são aquelas cujo significado pode ter vários e simultâneos sentidos para o mesmo observador.
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A verdade é que, como diz o poeta Alberto Pimenta, “cada coisa pode ser o contrário do que é”, porque “a função das coisas é ser aquilo que se quer que elas sejam”.
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sexta-feira, 27 de dezembro de 2013

O olhar dos outros

(Eduardo P. Lunardelli, visto por mim)
(eu, visto por Eduardo P. Lunardelli)
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Em fins de Outubro, Eduardo P. Lunardelli (do blogue Varal de Idéias, com link na barra lateral) propôs-me um repto: participar num curioso "intercâmbio internacional de caricaturas", que ele promove com artistas de todo o mundo e que edita num dos seus mais de quarenta blogues - propunha-se fazer a minha e convidava-me a  fazer a sua.
Inicialmente reticente, decidi por fim participar num joguinho que me parecia algo frívolo. Apesar de estar habituado a representar os outros, por vezes de forma impiedosa, tenho que confessar que observar-me visto por outros é uma novidade para mim e, como tal,  um pouco estranho. Mas como dizia Pessoa: "primeiro estranha-se, depois entranha-se". 
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Quando Eduardo me enviou o seu desenho (a minha caricatura), confesso que me custou digeri-lo. Mas já está. Apesar de algumas imprecisões "topográficas", reconheço que está lá tudo. "Numa das facetas desse diamante que se chama verdade".
O "joguinho algo frívolo" revelou-se afinal um exercício de inesperada profundidade. Como referi a Eduardo, "revelou-se um teste divertido à nossa capacidade de aceitar a ideia, ou a imagem, que os outros fazem de nós. Além disso, penso que é um exercício inteligente, que relativiza a dimensão dos nossos egos (faz-nos questionar a ideia que fazemos de nós próprios)".
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Quanto ao meu desenho, Eduardo gostou muito porque o achou "gentil". E acrescentou (Eduardo é um verdadeiro cavalheiro) outras gentilezas, que não me coíbo de publicar: "Seu traço tem muita personalidade. A decomposição, sua marca. Muito obrigado". 
Do meu retrato também gostei. Não por ser gentil. Ou muito preciso. Mas por ser verdadeiro. 
Eu gosto que me digam a verdade. Considero-o uma suprema gentileza. Sobretudo quando me fazem um desenho. 
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terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

A caricatura - de curso

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A edição de um livro (ou plaquette) de caricaturas de estudantes finalistas de um curso académico é uma tradição retintamente portuguesa - iniciada em Coimbra em 1903.
Este costume de perpetuar uma memória amável e risonha do tempo de estudante estendeu-se depois progressivamente a outras universidades do país.
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Zé Oliveira é um dos grandes caricaturistas de imprensa que se especializou em caricaturas académicas para livros de curso. Ao ponto de, com o seu desenho ágil, sintético e carismático, ter criado como que uma espécie de “cânone” do género, difícil de igualar.
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Recentemente porém, a crise económica e os prestimosos artifícios do Governo de Portugal criaram um fenómeno sem precedentes na história do ensino em Portugal: o abandono escolar massivo por motivos económicos - o que vem potenciando um inefável, e inédito em democracia, nivelamento por cima: os futuros doutores deste país serão, tal como no passado, oriundos exclusivamente das classes mais possidentes. E esta, hem?
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Talvez por isso resolvi, também eu, investir nesse ”nicho de mercado”. Que quereis, tenho tendência para investimentos de risco.
Sem tentar, como julgo evidente e razoável, concorrer com o inimitável Zé Oliveira proponho-me, modestamente claro, fazer humildemente o retrato de alguns desses nóveis dótores, representantes da futura classe dirigente, quando ainda tenros. No género pra memória futura.
Até já fiz um cartaz (reproduzido acima) que espalharei por toda a parte. Especialmente pelos locais apropriados.
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quarta-feira, 12 de setembro de 2012

Rodin

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Quem, como eu, faz da prática do desenho um método quotidiano de reflexão sobre o mundo tem uma relação, de certo modo privilegiada embora quase sempre embaraçosa, com os seus maiores cultores – os mestres.
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Os velhos mestres não se limitaram, como simples poetas, a dar uma visão impressionista da cor local e do estado do tempo, no seu tempo. Foi antes como filósofos que, através do raciocínio, da reflexão e do cálculo se “apoderaram” da sua época - e até do tempo e do seu estado - os seus desenhos são uma espécie de “visão global” ou expressão “canonizada” disso mesmo.
Matisse, por exemplo, dizia mesmo que o desenho é a expressão da posse das coisas: “Um desenho não será a síntese, o final de uma série de sensações que o cérebro reteve, reuniu, e que uma nova sensação acciona, de tal modo que eu executo o desenho quase com a irresponsabilidade de um médium? Ele encarava o desenho “não como um exercício de destreza particular, mas sim como um meio de expressão de sentimentos íntimos e descrições de estados de alma”; os seus desenhos funcionam “como meios simplificados para dar mais espontaneidade à expressão”.
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Creio que esta relação com o desenho é cada vez mais rara. O entendimento do desenho como uma disciplina que permite a apreensão do sentido profundo das coisas, praticamente não existe já na chamada arte contemporânea. Noto mesmo que entre pintores, a prática do desenho é encarada hoje com ostensivo desprezo. A arte contemporânea deixou de ser uma linguagem com vocação universal, para passar a ser um dialecto restrito, muito difundido mas pouco entendido.
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Estamos longe dos tempos de Giotto, Brunelleschi, Miguel Ângelo, Leonardo, Dürer, Rembrandt, Goya, Daumier, Seurat, Klimt, Schiele, Posada, Matisse, Picasso, ou Hockney; demiurgos que se apossavam, através do desenho, de tudo o que viam. 
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É por isso que a notícia de uma exposição de desenhos “perdidos” de Auguste Rodin me deixa entusiasmado. Também ele pertence a essa longa linhagem de grandes mestres para quem, como referia Ingres, “o desenho é a probidade da arte”.

A foto, de Edward Steichen, é de 1902. Também é magnífica.

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sábado, 16 de junho de 2012

Lula Palomanes ou "a arte sem limite de transgressão"



Aquele que já não consegue sentir espanto nem surpresa está, por assim dizer, morto; os seus olhos estão apagados. Albert Einstein
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Eu estava "à toa na vida", googlando. Eis senão quando, descobri Lula Palomanes, desenhista.
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Palomanes é um rapaz quase da minha idade, imaginem. Mas já é um desenhador do caralho. E tem um blogue que só visto; é lá que divulga o seus desenhos publicados, as suas ilustrações e as suas caricaturas. Vai já aqui para o lado; ao pé dos outros que recomendo.
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Ao alto, o ex-presidente da Silva, visto pelo seu  homónimo, o grande Palomanes.
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sábado, 31 de dezembro de 2011

O boneco do ano é o… "salazarinho"!!!


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A caricatura não é, por definição, um retrato amável, ou flateur. É sempre um retrato parcial. Isto é, um retrato com opinião. Na caricatura não há, como no retrato, espaço para subtilezas subliminares, idealizações aduladoras ou interpretações subjectivas. Numa caricatura, as preocupações de verosimilhança são apenas as suficientes para que se identifique o modelo. A deformação, a desproporção, a cor e outras soluções gráficas achadas pela imaginação é que fazem de uma caricatura um retrato enfático, com intenção. Ou seja, toda a caricatura é uma opinião.
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Durante este ano, entre cartoons, charges, meros apontamentos ou simples reflexões, publiquei neste blogue cerca de 112 caricaturas de personalidades que, de uma forma ou de outra, foram pontuando a actualidade e a minha atenção.
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Se eu tivesse, como certos bloguers, que escolher a figura mais marcante do ano, escolheria a de Vítor Gaspar, o ministreiro das financinhas.
E porque sim. - A evidência da sua personalidade é tão marcantemente alta que se repercute em baixa na minha (e dos meus) qualidade de vida. - Querem algo mais marcante?
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Segundo noticiado recentemente pelo “Correio da Manhã”, o sujeito é conhecido entre os seus colegas de governo pelo petit nom ternurento de “salazarinho” – certamente pelas suas qualidades - o que também diz muito da escala de valores e de afectos daquela maltosa.
Curiosamente, a 16 de Agosto (quando editei a caricatura) a minha impressão sobre Gaspar - que enunciei no pequeno texto com que tenho por hábito ilustrar de alguma subjectividade as minhas opiniões (os meus desenhos) - era precisamente a de que o sujeitinho me fazia lembrar o outro. Impressão corroborada agora, segundo o “Correio da manhã”, pelos amigos próximos do fenómeno.
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O que prova que um retrato opinativo também pode ser realista. E que uma caricatura pode ser um retrato fiel. É uma questão de intuição. Ou de intenção.
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Mas e agora, não se pode, sei lá, defenestrá-lo, ou assim? – perguntais vós - este que agora começa, ainda podia ser um bem Feliz Ano Novo.

- Que quereis que vos diga, ó meus amigos. O bom povo de Lisboa fê-lo (com a devida vénia) a D. Martinho de Zamora (que deus tem), em 1383; e a D. Miguel de Vasconcelos (idem idem, aspas aspas), em 1640. E consta que foram anos muito marcantes.
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segunda-feira, 11 de julho de 2011

João Cabral de Melo Neto

A educação pela pedra

Uma educação pela pedra: por lições;
para aprender da pedra, frequentá-la;
captar sua voz inenfática, impessoal
(pela de dicção ela começa as aulas).
A lição de moral, sua resistência fria
ao que flui e a fluir, a ser maleada;
a de poética, sua carnadura concreta;
a de economia, seu adensar-se compacta;
lições da pedra (de fora para dentro,
cartilha muda), para quem soletrá-la.

Outra educação pela pedra: no Sertão
(de dentro para fora, e pré-didática).
No Sertão a pedra não sabe lecionar,
e se lecionasse, não ensinaria nada;
lá não se aprende a pedra; lá a pedra,
uma pedra de nascença, entranha a alma.





João Cabral de Melo Neto é um poeta raro.
Construía os seus poemas com o rigor de uma equação matemática; metódica e sistematicamente, ele subtraía às parcelas a intuição, a inspiração, o lirismo, a subjectividade, o adorno, o sentimentalismo e muitas outras palermices mais ou menos bem aceites na poesia convencionada. Ficava só o cerne. O osso. O essencial.
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É mais ou menos isso que eu tento fazer com os meus desenhos: depurá-los de traços supérfluos. Só me dou por satisfeito quando um deles fica tão conciso e perfeito como o mais canhestro dos versos de João Cabral.



João Cabral de Melo Neto detestava a música. Para ele, toda a exigência era visual. Apesar disso, quando vejo - digo bem, vejo (o apelo visual é iniludível) - um poema de João Cabral, sou acometido por aquela espécie de deslumbramento que me acontece quando oiço Bach - tal como João Sebastião, a obra de João Cabral também foi “iluminada por aquela estranha geometria que desperta no espírito uma sensação de exactidão e de evidência absoluta".



E tudo isto em português. Com poetas como João Cabral de Melo Neto eu não preciso de aprender línguas para ter experiências exaltantes. É como ir para fora, só que por dentro.

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quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

O sonho americano


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É verdade. A América continua ser a terra dos sonhos. Lá na América actores sem talento, idiotas chapados e até mesmo pretos podem ser presidentes (privilégio que por cá está consagrado apenas aos idiotas). Mas também se pode ter sérios problemas com o desenho e com o álcool e mesmo assim atingir o firmamento das artes (pensando bem, por cá também).
Hoje, o Google relembra o aniversário de Jackson Pollock e a perenidade do sonho americano (no seu sentido lato, globalizado).
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Este conceito, “american dream”, é o principal contributo da América para a filosofia ocidental. Trata-se de um conceito segundo o qual qualquer idiota pode ser qualquer coisa. Basta querer muito. Estar no lugar certo à hora certa. Fazer figas e pôr-se a jeito.
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quinta-feira, 31 de julho de 2008

a mão que obedece ao intelecto


Non ha l’ottimo artista in sé alcun concetto
Ch’un marmo solo in sé non circunscriva
Col suo saverchio;
E solo a quello arriva
La man che ubbidisce all’ intelletto
Miguel Ângelo Buonarrotti



Este “desenho” começou aqui, no Outono, um esboço hesitante.
Aqui, já prometia. Era Primavera.
Mas olhem para ele agora, no esplendor do Verão.
Não foi necessário “ideia alguma”, nem nenhum “óptimo artista”, apenas cuidados, paciência e - “a mão que obedece ao intelecto”.
Miguel Ângelo tinha razão:

“Não tem o óptimo artista em si ideia alguma/ 
Que um mármore em si não circunscreva / 
Com seu excedente; e só a atinge / 
A mão que obedece ao intelecto”

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domingo, 18 de novembro de 2007

O (meu) fantas

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(aguarela e nanquim s/papel)
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Há anos atrás, tentei ir para além das experiências com a impressão no meu pequeno atelier de artes gráficas, serigrafia e publicidade. Levei a ênfase(!) criativa ao ponto de participar em concursos de ideias e soluções gráficas, cartoons, cartazes, etc., um pouco por todo o lado.
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Estas eram duas das minhas sugestões para a mascote do FantasPorto.
O concurso para uma solução gráfica de uma mascote do conhecido festival de cinema fantástico ocorreu por volta de 1992 ou 93, não me recordo ao certo, como também não me recordo qual a solução escolhida, e premiada. Não terá contudo sido muito “utilizada” no marketing de promoção do referido festival, porque dela não tenho memória.
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Da memória, e de entre os papeis do meu baú, resgatei estas duas tentativas que julguei, na época, se adaptariam bem ao espírito “enfant terrible”, fantástico, rebelde e bem-humorado que o festival pretendia dar de si e não tanto à coisa mais generalista, nem carne nem peixe, em que se foi transformando… para ir sobrevivendo.
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quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Um esboço

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É Outono, quarto minguante.
Hoje de manhã, comecei um desenho. De um pessegueiro.
Olhem para ele, entre duas obras-primas, duas vetustas macieiras.
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sábado, 15 de setembro de 2007

Thelonius Monk, round about midnight

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Como um desenho, a traço preto sobre um papel branco.
Vejam como aqui os silêncios são tão importantes como os sons.
São como os “vazios” num desenho antigo oriental ou num arabesco de Matisse. Completam e preenchem de harmonia, a composição.
Ouçam como o piano percutido (nunca o piano foi, como aqui, um instrumento de percussão), desenha a melodia, como que reflectindo e hesitando cada nota, como o velho mestre cada traço.
Pressentem o Génio, no seu estado puro?


segunda-feira, 21 de maio de 2007

o sentido do Desenho

Matisse dizia que o desenho é a expressão da posse das coisas: “Um desenho não será a síntese, o final de uma série de sensações que o cérebro reteve, reuniu, e que uma nova sensação acciona, de tal modo que eu executo o desenho quase com a irresponsabilidade de um médium?
Ele encarava o desenho não como “um exercício de destreza particular, ”Mas sim como um meio de expressão de sentimentos íntimos e descrições de estados de alma”; os seus desenhos funcionam “como meios simplificados para dar mais espontaneidade à expressão”.
Creio que esta relação com o desenho é cada vez mais rara. Este entendimento do desenho como uma disciplina que permite a apreensão do sentido profundo das coisas, praticamente não existe já na chamada arte contemporânea. Ainda Matisse: “Contaram-me que os professores chineses diziam aos alunos: Ao desenharem uma árvore, devem ter a sensação de subir com ela quando começam pela base. ”Quem pontifica são os “filhos de Duchamp” para quem a anti-arte corrosiva, de protesto, do seu guru, passou a ser uma arte de citações e alusões dentro do universo fechado da linguagem artística dita contemporânea e a uma espécie de contrabando de imagens (ou não-imagens) sem sentidos e com cada vez menos sentido para o “espírito do espectador”. Noto mesmo que entre pintores, a prática do desenho é encarada hoje com ostensivo desprezo.
Estamos longe dos tempos de Matisse ou de Picasso, esse demiurgo que se apossava, através do desenho, de tudo o que via.

A arte deixou de ser uma linguagem com uma vocação universal, para passar a ser um dialecto restrito, muito difundido mas pouco entendido.
Mas um último reduto, onde a prática do desenho ainda vive e se recomenda, é no cada vez mais rico e variado mundo da banda-desenhada.
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