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domingo, 17 de novembro de 2024

O esplendor do bacôco, “remeide” in Portugal


 

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Joana vasconcelos foi a Foz Côa visitar o museu do Côa e conhecer “a força das gravuras rupestres”. Em entrevista à agência Lusa, a artista disse “há um lado artístico extraordinário” naquelas representações pré-históricas.

Mas ainda disse mais.

Disse que a arte do Côa é “o início da portugalidade”.

As declarações foram feitas á margem do 1º Congresso Internacional sobre o Barroco.

Por outro lado, a artista confidenciou à Lusa que “encontrou uma cidade que se quer contemporânea” e daí ter aceitado expôr a instalação Jardim do Éden, que se encontra no centro cultural até ao fim do ano. A mesma instalação que esteve no Museu da Electricidade em Lisboa, no âmbito de uma exposição chamada “remade em Portugal”.

Joana não descartou a ideia de fazer uma criação inspirada na arte do Côa. “Há sempre algo que fica e vai contribuir para o meu futuro enquanto artista. Vir a Foz côa foi fundamental. A ideia de esplendor, que é uma ideia muito barroca, existe aqui na natureza.”

Foda-se. Estas coisas não se inventam. Vejam aqui a peça da agência Lusa que, não desfazendo, é ela mesma um verdadeiro pedaçod'arte e de autêntico jornalismo contemporâneo remeide in Portugal.

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sábado, 25 de maio de 2024

A arte de fazer pensar em toda a linha

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Passo por irreverente e pode ser que não seja calúnia

Leal da Câmara (em carta a Aquilino)


Ainda que este seja um blogue de desenhos e eu me interesse muito naturalmente por tudo o que diga respeito à expressão gráfica e à arte da caricatura, a verdade é que também aprecio uma boa prosa. Por isso quando, num alfarrabista em Aveiro, me caiu nas mãos uma bela edição, encadernada, do Leal da Câmara, de Aquilino Ribeiro, não resisti.

Comprei-o, pois está claro.

Embora o meu exemplar seja de uma edição de1975, a obra data de 1951, três anos após o falecimento do artista. São duzentas páginas da mais saborosa e torrencial prosa sobre a vida e obra do melhor, mais consequente e influente caricaturista português da primeira parte do século vinte e, talvez também, o de mais sucesso (e proveito) internacional.

Aquilino não se poupa de pormenores deliciosos em episódios da vida atribulada de um personagem invulgar que esteve exilado no estrangeiro para não ir dentro e ser deportado para as colónias, um caricaturista especialista no “apupo homérico”, naquilo que “Colette chamava les dessins barbares de Camara”; que ilustrou Ana de Castro Osório e Junqueiro, conviveu com gente como Trotsky, que foi amigo de Valle Inclán - “foi na sarrafusca duma tertúlia de arte e literatura que, por causa de Leal da Câmara, Valle Inclán, catedrático de estética, como se intitulava nos bilhetes de visita, perdeu um braço”- de Ruben Dario e de Perez Galdós e, “com o seu lápis vermelho”, flagelou as “taras físicas e morais de reis e magnates” do seu tempo, primeiro em A Corja e na Marselhesa e depois no Assiette au beurre, ombro-a-ombro com Caran d'Ache, Forain, Grandjouan, Steinlen, Juan Gris, Willette ou Jean Veber, os mais célebres caricaturistas da Belle-Époque. Tudo isto antes de se retirar para a Rinchoa, em Sintra, onde finalmente se casou e se dedicou à melancolia e à vida simples (o ensino, o estudo do saloio, a pintura, a ilustração de livros infantis, a decoração, o desenho de móveis) e depois morreu.

Este livro está repleto de pérolas preciosas. A propósito do riso e da caricatura Aquilino permite-se discorrer tão livremente sobre Leal da Câmara como se falasse de si mesmo. Eis algumas que não me importo de partilhar. Ora tomem lá:

  • Em obediência ao princípio de Spielmann: Nenhum desenho é uma verdadeira caricatura se não obriga a pensar, as suas legendas políticas ou sociais constituem verdadeiras epigrafes de capítulos da história contemporânea”.

  • À parte a casuística, a caricatura é acima de tudo a arte do riso no seu significado próximo de vaia”.

  • De ordinário o riso implica reacção, no vero sentido do termo, de Cristo contra Caifás, do murganho contra o sapo. Quando o riso é revolta, a favor do pobre contra o rico, do oprimido contra o tirano, do governado despoticamente contra o governante cheio de prepotência, esse riso é salutar e generoso. Tal o riso de Daumier e de Leal da Câmara.”

  • Não sei quem foi que classificou Leal da Câmara de artista diferente. Diferente sem determinativos. E, reflectindo bem, tal simplificação convém-lhe. Não se pode ser totalmente à parte do mundo em que nos movemos ou na arte a que nos consagramos de todas as veras. Mas podemos sê-lo tanto que não haja outro próximo de nós a projectar-nos a sua sombra. Tal sucede com Leal da Câmara.”

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A casa que Tomás Júlio Leal da Câmara adquiriu em 1930 e habitou durante os seus derradeiros anos foi doada ao Município de Sintra em 1965, por morte da sua viúva. É hoje a Casa-Museu Leal da Câmara e acolhe um valioso espólio.

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domingo, 17 de setembro de 2023

Fernando Botero (1932-2023)


 

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Lo que me interesa no son los seres, sino la manera en que sus volúmenes se inscriben en el espacio. Veo la vida en volúmenes.

Fernando Botero

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quarta-feira, 8 de junho de 2022

Paula Rego (1935-2022)


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“-O que a leva a pintar? Porque pinta?

- Pinto para dar face ao medo, como acabei de dizer a uma professora de Artes Plásticas que me fez a mesma pergunta.

– Mas hoje já não há medo aqui. Havia nos anos em que pintou estas obras?

Acha que não há medo agora? Não sente medo? Eu sinto.

– Sente medo ou medos, de quê?

– Sinto muito medo!”

 Paula Rego, ao “Correio da Manhã 

 

Paula Rego é alguém muito invulgar.
Como artista, é peculiar. Nestes tempos em que tudo é cada vez mais conceptual, Paula faz compulsivamente (com as mãos ambas) algo tão físico que já quase nenhum artista faz: desenhar.
Como portuguesa, também é uma excepção incaracterística: não faz aquilo que distingue os portugueses: rodriguinhos, eufemismos, paninhos quentes. Paula escarafuncha na ferida exposta com a curiosidade mais infantil, o rigor mais cirúrgico e o deleite mais conspícuo.

Paula não tem frio nos olhos. O seu trabalho tem uma característica manifesta que partilha com Picasso: uma consciente, sincera e explícita crueldade.
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Paula Rego morreu hoje, aos 87 anos, em Londres.

O desenho, tal como o texto, é de 2008.


segunda-feira, 25 de abril de 2022

Mingus Mingus Mingus Mingus Mingus

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No passado 22 de Abril, Charles Mingus, “the angry man of jazz”, teria completado cem anos, se não tivesse soçobrado aos cinquenta e seis, em 1979, colhido pela esclerose lateral amiotrófica, a mesma foicinha estúpida, malévola e letal que também levou o Zeca.

Mingus foi um génio turbulento, excêntrico e truculento e um dos mais inspirados, exuberantes e pouco convencionais compositores, arranjadores e instrumentistas do jazz, e da música de forma geral. Multi-instrumentista (principalmente contra-baixista, mas também pianista, trombonista e violoncelista) também era conhecido pelo seu comprometimento anti-racista.

Uma feroz e irredutível intransigência em comprometer a sua integridade artística e um certo número de experiências traumatizantes ligadas ao racismo sempre provocaram nele, em palco e não só, numerosas e temíveis erupções de cólera e violência física que lhe valeram a fama de homem-zangado do jazz. Uma fama quase tão justa como o prestígio altivo, afirmativo, límpido e sem concessões, da sua imensa música.

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quarta-feira, 15 de setembro de 2021

Começou a campanha eleitoral


Os povos antigos ou são tristes, ou são cínicos. A nós, portugueses, coube ser tristes. 
António de Oliveira Salazar


Não há como a música para “produzir entusiasmo“. E não há como a música popular para exaltar as hostes em tempo de eleições. Para este propósito galvanizante são necessários, contudo, profissionais muito qualificados.

Quim Barreiros é o mais profissional e qualificado destes artistas engajados na difícil arte de produzir entusiasmo (foram muitos anos a-assar-frangos).

A sua simples presença num espectáculo gratuito, contratado plo candidato e anunciado com aparato, facilmente atrai o público-alvo ao redondel do comício. Depois, o seu bailinho lúbrico e o seu verso de duplo sentido depressa fazem as maravilhas pretendidas. Não sem um ou outro bis, mais um riff de acordeão e uma rima atrevida num compasso previsível e eis que, corações ao alto, todas as consciências estão no ponto do rebuçado para escutarem o discurso do candidato - e disponíveis para todos os vivas e os abaixo que o entusiasmo suscite. 

No fim, o candidato paga o pato e agradece-lhe. O Quim embolsa o combinado, diz-lhe que não tem de quê e vai “produzir entusiasmo” para outro concelho, que o tempo urge e a campanha eleitoral tem os dias contados. Viva o povo. Viva o candidato que paga-o-pato. Viva a campanha eleitoral. Viva a música prapular portuguesa.

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terça-feira, 17 de agosto de 2021

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

Ludwig van Beethoven


 Fazer todo bem que se possa, amar sobretudo a liberdade e,

 mesmo que seja por um trono, jamais renegar a verdade.

 Ludwig van Beethoven
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sábado, 23 de maio de 2020

Fritz Lang


Quando a humanidade, subjugada pelo temor da delinquência, 
se tornar louca por efeito do medo e do horror, 
e quando o caos se converter em lei suprema, 
então terá chegado o tempo para o Império do Crime.
Fritz Lang, in O Testamento do Dr. Mabuse
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Adoraria ter feito filmes em 1920, ter vinte anos nessa altura. Ter tirado partido da época dos pioneiros. Quando comecei, o cinema era já coisa arqueológica, já tinha uma história, já havia escolas de cinema e já se tinha estabelecido há muito o processo de o intelectualizar. Nos seus primeiros tempos o cinema pertencia à feira e eu ainda o sinto um pouco assim.” – escreveu Fellini no seu “Fellini conta Fellini".
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Fritz Lang foi um desses pioneiros. Foi ele um dos que tirou o cinema da feira para o tornar no que, como ele próprio referiu - poderia ter sido uma arte, estabelecendo os cânones intelectuais do que viria a ser uma nova linguagem de causar sensações. Sem ele não teria havido Alfred Hitchcock, nem Luís Buñuel. 
Foi a ver os filmes de Lang que ambos descobriram as suas vocações. Buñuel escreveu mesmo, em “O meu último suspiro”: “Foi ao ver As três luzes que senti, sem sombra de dúvida, que queria fazer cinema. Não eram as três histórias propriamente ditas que me interessavam, mas sim o episódio central, a chegada daquele homem de chapéu negro – apercebi-me logo de que se tratava da morte – a uma vila flamenga, e a cena do cemitério. Houve algo neste filme que me tocou profundamente, iluminando a minha vida, sentimento esse que foi confirmado ao ver outros filmes de Fritz Lang, como, por exemplo, Os Nibelungos e Metrópolis.”
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Não é pouco, convenhamos. Por isso vale a pena rever, se se puder, todos os filmes de Lang. Nestes lúgubres e novos tempos de crescente fanatismo e indiferente estupidez, há algo de novo, de iniciático, em rever alguém fazendo as coisas pela primeira vez. Ilumina uma vida.
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segunda-feira, 6 de agosto de 2018

Daniel Barenboim

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Aos que se preocupam, não morri. Ainda. Até tenho andado menos mal, dadas as circunstâncias. Mas o que me chega do rumor do mundo tem-me acabrunhado. E, como não tolero repetir-me, tenho adiado constantemente a actualização deste pobre e inútil blogue.
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Muitos falam da banalidade do mal como um sinal dos tempos. A verdade porém é que sempre foi assim. Muitos anos antes de Hanah Arendt já Eugene Delacroix o tinha constatado: “o horrível está por toda a parte”, decretava ele, desolado, no seu diário.

E, no entanto, há sempre quem (mesmo entre os que têm fácil acesso aos grandes meios de comunicação) não se ache confortável diante deste triunfo ufano da estupidez e faça questão de o dizer - por escrito - num jornal de grande circulação. Como outrora o escritor Emile Zola. E, como agora, o maestro Daniel Barenboim.
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segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Tom Zé

Vá tomar!

Meta sua grandeza
no banco da esquina,
vá tomar no verbo
seu filho da letra

meta sua usura
na multinacional
vá tomar na virgem
seu filho da cruz.

Meta sua moral,
regras e regulamentos
escritórios e gravatas
sua sessão solene.

Pegue e junte tudo
passe brilhantina
enfie, soque, meta
no tanque de gasolina 

Tom Zé, No jardim da política
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terça-feira, 1 de novembro de 2016

Posada

la muerte es democrática, 
ya que a fin de cuentas, 
güera, morena, rica o pobre, 
toda la gente acaba siendo calavera
José Guadalupe Posada
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sábado, 10 de setembro de 2016

Mário Silva

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Dizem-me que o Mário morreu. Há tempos escrevi neste blogue dois parágrafos a seu respeito. São os que se seguem.

Mário Silva é um dos maiores artistas portugueses vivos e um espírito livre. Um artista excêntrico, obstinado, anárquico e contestatário. Nunca obedeceu a qualquer corrente. Assumiu um estilo independente e, não obstante, “conseguiu vingar”- o que, neste país, é obra.
Fora disso, é uma espécie de duende folgazão cuja existência nos iliba da nossa irreprimível e atávica melancolia. Gosta de cães, de mulheres, de vinhos (tintos), de amigos e da arte (não necessariamente por esta ordem. Aliás, o Mário detesta qualquer tipo de ordem). Ah, e é meu amigo.

Por ser tudo verdade, nada mais tenho a acrescentar - não me ocorre mais nada neste filho da puta deste dia que também levou outro grande, o escultor José Rodrigues.  
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terça-feira, 6 de setembro de 2016