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A Figueira da Foz já foi (antes do turismo de massas) um sítio de veraneio de
referência (quando não havia outros) para uma certa burguesia muito selecta - no
tempo em que, à volta, as massas viviam na mais abjecta penúria.
Mas
a visão risonha desse passado de festas, animação e cosmopolitismo deriva sobretudo
dos efeitos de duas guerras (a de Espanha e a Mundial) cujos refugiados em
trânsito enchiam (no final dos anos 30 e no início dos 40) as suas ruas de mundana
animação, as esplanadas dos seus cafés de risos e os seus casinos de lucros.
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A verdade é que, nesses tempos, a maior parte dos
figueirenses mourejavam na mais negra miséria - mulheres e crianças nas secas
do bacalhau e nas conservas ou, homens feitos e rapazinhos, em estaleiros
navais, nas minas de carvão, fábricas de vidro e de cimento ou então, num infame
degredo esclavagista, na pesca do bacalhau.
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Entretanto, acabaram-se a pesca do bacalhau e a seca, as
conservas, os estaleiros navais, as minas de carvão, a fábrica de cimento e até
a da cal (recentemente os políticos locais cantaram hossanas em uníssono ao
encerramento desta última, que assim desafectou valiosos terrenos que reservam - naturalmente em prestimosas parcerias publicóprivadas - a gloriosos empreendimentos turísticos).
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A verdade é que os figueirenses não são dados ao
empreendedorismo. Salvo o hoteleiro. O turístico, claro. Como refere o filósofo
e vereador local António Tavares, na sua obra “Arquétipos e Mitos da psicologia social figueirense”, “A Figueira da Foz está sempre à espera de algo
que vem de fora”. Criar riqueza é uma coisa que não os
assiste. Preferem servir os que têm alguma.
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Alugar-lhes quartos, por
exemplo. O desenho reproduzido acima - de Cândido Costa Pinto, um figueirense - publicado no
“Sempre Fixe” a 5/8/1937 (em plena guerra civil espanhola), de um humor negro talvez
demasiado politicamente incorrecto para que hoje fosse sequer publicável, é um
retrato impiedoso mas ainda fiel da mais perene mentalidade figueirinhas.
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