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segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Manoel de Barros

O apanhador de desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios. 
Não gosto das palavras 
fatigadas de informar. 
Dou mais respeito 
às que vivem de barriga no chão 
tipo água pedra sapo. 
Entendo bem o sotaque das águas 
Dou respeito às coisas desimportantes 
e aos seres desimportantes. 
Prezo insetos mais que aviões. 
Prezo a velocidade 
das tartarugas mais que a dos mísseis. 
Tenho em mim um atraso de nascença. 
Eu fui aparelhado 
para gostar de passarinhos. 
Tenho abundância de ser feliz por isso. 
Meu quintal é maior do que o mundo. 
Sou um apanhador de desperdícios: 
Amo os restos 
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato 
de canto. 
Porque eu não sou da informática: 
eu sou da invencionática. 
Só uso a palavra para compor meus silêncios.
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3 comentários:

cid simoes disse...

«Poesia é voar fora da asa.» Manoel de Barros. É o modo mais poético que encontrei para definir a poesia.
É a raiz do meu blogue «voar fora da asa».

Judite Castro disse...

:)
Gostei muito

platero disse...

NA MORTE DE MANOEL DE BARROS
dos que estavam
”atravancando o meu caminho”
nenhum teve asas
para me acompanhar
ao infinito
não me lamento
- nem um ai
nem um grito
sou um pé-de-vento
vou melhor
sózinho
agora já ninguém
nem nada
"atravanca o meu caminho"