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Nunca vi lugar do mundo onde os chamados “clubes de serviços” tenham mais destaque social e projecção mediática do que neste pobre lugar
bisonho que é a Figueira da Foz.
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-Não há esquina ou jardim desta triste choldra arruinada em
que não se tropece num marco, numa lápide, num monumento de referência aos “serviços”
de um destes inefáveis clubes onde “líderes de negócios”” se juntam em
estranhos cerimoniais ajantarados, sem aventalinho mas com imensos salamaleques,
para praticar a caridadezinha.
-Não há jornaleco ou folhetim pacóvio local que em páginas
ímpares não dê brado, num basto noticiário acéfalo e babado de encómios, a mais
um dos seus “serviços” benfazejos. É preciso que se diga que o objectivo destes
clubes é “incentivar a servir”, pelo que até estão isentos de alguns impostos e
mesmo alguns “benefícios secundários” dos seus membros, tais como “redes
de relacionamento e oportunidades de crescimento pessoal”, apenas “encorajam o
envolvimento”.
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É pois um espanto e um mistério que com tantos serviços
prestados à cultura e à “solidariedade social”, a Figueira da Foz continue a
definhar a olhos vistos, num infame atraso de vida cada vez menos e mais mal
frequentado.
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Vem isto a propósito desta notícia espampanante,
publicada no “jornal” As Beiras: “Rotary cria primeiro parque florestal urbano do mundo”. Nem mais.
Então é
assim: o município cede os terrenos por 25 anos e presta apoio técnico; a
Soporcel oferece as árvores e a Celbi fornece o composto, mas o inefável clube
Rotary é que cria o “primeiro parque florestal urbano do mundo”!!!.
Digam lá
que não é de génio. - Foda-se, só visto, porque contado ninguém acreditava*.
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Este é o género de fenómenos apenas possível num meio cultural labrego que cultiva com
gosto alarve o entretenimento cretino e padece de um fascínio mórbido pelo
inaudito dos recordes do Guiness Book - um antro de uma cidadania abúlica e basbaque,
de tal modo permissiva e acrítica que é incapaz já até do escárnio; quanto mais
da reflexão, do reparo, da crítica, do protesto ou, muito humildemente que
seja, de questionar o poder local por alienar, pelo tempo de uma geração, património
público que lhe cabe gerir para benefício de todos.
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Talvez por isto não tive conhecimento de sobressalto cívico
algum por mais esta tão esconsa como patusca parceria publicóprivada. Mas tenho algumas dúvidas que me assaltam e que, embora
não tenha esperanças de ver respondidas, condenso em duas simples questões:
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-para que caralho quer a autarquia o Horto Municipal, se este
não é capaz de criar e gerir um parque florestal urbano?
-que caralho de competências (botânicas, de engenharia
florestal, de poda, de propagação de espécies por enxertia ou mergulhia, de
conservação de sementes, etc.) exibe o Rotary Club que o capacitam para “criar”
e gerir um parque florestal urbano?
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*Devo dizer que nada tenho contra o voluntarismo benemérito
dos "clubes de serviço" ou quejandos, desde que seja a expensas próprias e só depois
de publicamente demonstradas competências exigidas para o empreendimento.
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