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quinta-feira, 21 de julho de 2016

Meu Brasil

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O Brasil não tem povo, tem público
 Lima Barreto
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Visto da minha infância, em Angola, o Brasil parecia-me uma espécie de irmão mais velho. Emancipado. Insolente. Tomava liberdades e abria as vogais  quando nós, cheios de pruridos de boas-maneiras, ainda as fechámos. “Quando li Jubiabá, me cri António Balduíno...”, cantava então Mário António, um dos nossos poetas mais dotados. Era o Brasil de Jorge Amado, de Graciliano, de Lins do Rego, de Érico Veríssimo.
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Depois, descobri Guimarães Rosa e os poetas e os modernistas e João Cabral; e Canudos e Glauber Rocha e Zumbi dos Palmares e Hermeto Pascoal e Garrincha e Castro Alves e Tom Jobim e o Boca do Inferno e Pixinguinha e Portinari e Machado de Assis e Chico Buarque e as xilogravuras do nordeste e o Aleijadinho e Mário de Andrade e Villa-Lobos e Niemayer e Arnaldo Antunes e Lima Barreto e Millôr Fernandes e Hilda Hilst e Laerte e Burle-Marx e Ruben Fonseca e Tom Zé e o Bispo do Rosário.
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Mas o Brasil que venho descobrindo recentemente não tem nada que ver com este (é menos notório visto de fora), e no entanto, existe e é tão real e verdadeiro.Trata-se de um outro lado do Brasil. Receio mesmo que não seja o seu lado B.
É o Brasil de Jair Bolsonaro - o do preconceito, da prepotência brutal e da violência instituída (social, racial, sexual) do previlégio branquela. Está lá desde a descoberta. E persiste. Até mesmo, por reflexo, em Jorge Amado (conheço poucos livros tão violentos como Teresa Batista, por exemplo). É omnipresente. Está em tudo, venéreo e insidioso, até nos mais belos milagres do outro lado do Brasil: do sonho do Quilombo dos Palmares ao calvário do Aleijadinho e do delírio de Canudos ao pesadelo do Bispo do Rosário. 
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Quanto ao retrato propriamente dito do imbecil que no Senado declamou ódio eterno à presidente do seu país e igual afeição pelo seu torcionário, resolvi emprestar-lhe a pose e as botas de cano alto do Capitão Justiniano Duarte da Rosa, o Capitão Justo do romance de Jorge Amado. Creio que lhe servem na perfeição. Parece-me o mesmo personagem-tipo, ou tipo de personagem, se é que me faço entender.
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