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Em tempos de crise,
económica e de valores, a perversidade inerente a esse clima moral muito específico afere-se pelas bizarrias excêntricas dos
leilões de arte. É este o caso.
O “Almoço do Trolha”, de Júlio Pomar, um quadro a óleo de
1947, acaba de pulverizar recordes leiloeiros de arte do palácio do Correio
Velho. Uma semana antes, o mesmo quadro tinha sido declarado em processo
de classificação pela Direcção-Geral do Património Cultural, (facto inédito
com obra de um artista vivo). O que implica que, com tal protecção legal, “o seu proprietário, seja ele quem for”,
não poderá “vender a obra sem prévia comunicação” à direcção-geral do
Património” nem permitida a
sua saída para fora do território nacional, de acordo com a Lei de Bases do
Património Cultural”.
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Resumindo e concluindo: o
neo-realismo, arte de comunistas, acaba de ser avalizado, em simultâneo, pelo
Estado e pelos mercados.
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A triste ironia da coisa é que é precisamente quando os
direitos laborais em Portugal se encaminham para os padrões dos anos quarenta do
século vinte que o mercado da arte resolve consagrar uma pintura neo-realista
que representa a condição humana do trabalhador nesses anos de chumbo.
Nesse tempo, diz Pomar,
"Eu tinha vinte anos e não via futuro à minha frente. A minha perspectiva era vir a ser professor”. Hoje, considera que,
em certo sentido, a falta de esperança que vê nos jovens portugueses "é
semelhante à que sentia nos anos do antigo regime".
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à parte):
desconheço os
critérios que levaram o estado e os mercados a consagrarem deste modo uma obra do
neo-realismo. Esta súbita validação-cultural / valorização-monetária do neo-realismo
escapam decerto ao excelso critério do regedor da cultura da Figueira da Foz. Desconheço por exemplo, a este
respeito, se entre o espólio que Joaquim Namorado legou generosamente ao
município constava algo assinado pelo autor de “o almoço do trolha”; de qualquer
modo, e segundo qualquer das perspectivas, parece-me cada vez mais inexplicável
e desastrosa a cessão desse espólio, inteiramente de graça, ao Museu do
Neo-Realismo de Vila Franca de Xira. Sob qualquer ponto-de-vista chama-se, receio, delapidação de Património.
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3 comentários:
Já nos estava a fazer falta.
Tenho andado ocupado com o meu jardim.
Nesta época do ano reclama-me sempre os cuidados.
Mas no dia seis lá estarei. Eu ligo-lhe.
Não sei o que é que este "thank you" pretende mas aparece a despropósito em todos os blogues.
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