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sexta-feira, 11 de outubro de 2024

O poder, o jornalismo que faz carreira sem carteira e (ou) o charme discreto da burguesia


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Montenegro quer jornalismo sustentável, tranquilo, menos ofegante e sem perguntas sopradas (título de uma notícia do Correio da Manhã).

O primeiro-ministro falava no final da intervenção com cerca de trinta minutos, feita de improviso, na abertura da conferência sobre " O futuro dos Media" em Lisboa, perante uma plateia com muitos presidentes de empresas de orgãos de comunicação social nacionais e de dezenas de jornalistas.

Logo a seguir, Montenegro concedeu uma entrevista no seu gabinete a esse ícone do jornalismo sustentável, tranquilo, menos ofegante e sem perguntas sopradas que é Maria João Avillez. A senhora Avillez é realmente uma figura incontornável, não exactamente daquilo que eu considero jornalismo mas de todo um outro género: o que faz carreira sem carteira, e até já mereceu uma posta neste blogue, em 2014, com retrato, verbete, e tudo.

No entanto, e apesar de apesar, o incrível pastoreio de improviso que o senhor Montenegro acaba de cometer diante de toda a gente não é nada que o senhor Santana Lopes já não tenha perpetrado, também de improviso porém mais recatadamente, ao seu nível, na regional (estou a referir-me ao jornalismo regional, na Figueira da Foz). Como também referi aqui, a 15 de dezembro de 2022, Santana também reuniu com os presidentes de empresas de órgãos de comunicação social local e disse-lhes, timtim por timtim, como gostava do jornalismo, sustentável, tranquilo, menos ofegante e sem perguntas sopradas. Depois disso, só concede entrevistas ao Jot'Alves, do "jornal" Asbeiras que, não desfazendo, também são uns ícones, mas também não exactamente daquilo que eu chamo jornalismo.

Ou seja, a vida do senhor Santana Lopes na Figueira agora é um descanso e o seu desempenho na câmara municipal um passeio de fim-de-semana (sustentável, tranquilo, menos ofegante e sem perguntas sopradas).

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terça-feira, 8 de outubro de 2024

Montenegro e a cordilheira - ou a ascensão do lúmpen


 

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Todo o homem tem uma porção de inépcia que há-de sair em prosa ou verso, em palavras ou obras, como o carnejão de um furúnculo. 

Quer queira quer não, um dia a válvula salta e o pus repuxa.

Camilo Castelo Branco.


Cavaco Silva é o caso exemplar de que em Portugal é perfeitamente possível desempenhar os mais altos cargos remunerados - na academia, na política e na finança - enfim, ter sucesso, sendo-se estruturalmente analfabeto - isto é, desconhecendo, de todo ou em partes grandes, a mais elementar forma de se exprimir publicamente dentro das normas convencionadas da sua própria língua materna. 

Cavaco diz “não façarei”. Na caváquia (a pátria do Cavaco) todos fazem como ele. Marques Mendes, seu ex-ministro e candidato auto-proclamado a presidente da república, um hominídeo católico com mais de sessenta anos, manifestou-se esfuziantemente orgulhoso de si mesmo por ter descoberto recentemente uma palavra portuguesa de que ele nunca tinha ouvido falar: “genuflexório”. Nuno Melo, o ministro da defesa, fala como quem sabe do “tratado do atlético-norte”. Bugalho, o jovem serafim candidato da AD ao Parlamento Europeu, foi para Bruxelas cantando e rindo, muito ufano das “sete quinas da nossa bandeira”. A ministra do Interior confunde “urologia” com “orografia”. Estas coisas não se inventam.

Luis Montenegro, por exemplo, fez a instrução primária, a preparatória, o secundário inteirinho, licenciou-se em Direito na Universidade Católica (e pós-graduou-se em Direito da Proteção - assim mesmo, em acordês - de dados pessoais, na mesma universidade), exerceu advocacia, casou com uma senhora, foi pai de dois meninos, entrou para a maçonaria, ou talvez não, presidiu à assembleia geral de duas das maiores empresas portuguesas, entrou na política, foi deputado municipal, vereador, deputado à assembleia da República, líder da sua bancada e agora é primeiro-ministro - sempre a dizer “será-lhe”. 

Em 2012 debrucei-me pela primeira vez sobre este vulto da Caváquia. Foi quando ele era o líder parlamentar do PSD e referiu, a propósito de qualquer coisa, que a redução dessa coisa no orçamento não seria uma “Min-nun-dência”(!!!) no que concerne à redução do défice. 

O que então me pôs a pensar não foi a substância de tão pertinente convicção mas sim a ênfase substantiva, o à-vontade sorridente e orgulhoso-de-si-mesmo, o ar inflamado e descomplexado, do tribuno. Na época concluí que a literacia, ou melhor, a falta dela em Portugal não era apenas uma min-nun-dência, mas um verdadeiro Monte Negro. E deduzi que, com os outros deputados do seu grupo parlamentar, ele conformaria uma autêntica, incontornável, cordilheira.

Mas receio que agora seja bem maior – e pior – pois se, além destes, somarmos o remanescente dos cristãos-velhos do CDS; uma terça parte da bancada cor-de-rosa, a do sucialismo empresarial; mais o Branca-de-Neve e os quarenta e nove rolões pretos do integralismo chegano e ainda os quéques azul-bébé do liberalismo luzitano - será fácil de verificar que todos juntos, todos muito ardentemente sionistas-novos, conformam um acidente sociológico de uma densidade tão impenetrável a qualquer conceito de justiça elementar como inacessível a qualquer ideia generosa ou noção de bom-senso e de decência.

Não creio, como sugere a imprensa dominante, que isto configure qualquer emergência súbita de um certo povo-baixo, mas sim a ascensão lenta do lúmpen; de um lúmpen velhaco e vingativo, dotado daquele género de sensibilidadesinha medíocre que exulta, alarve, com a assunção da sua própria desfaçatez e se compraz, condescendente e cúmplice, com a expressão pública da ignorância rasa e da grosseria refinada na mais espessa estupidez.

Tudo isto no ano em que, paralelamente, o país oficial comemora impávido e mui solene os cinquenta anos do Vinte e Cinco d' Abril. Um fenómeno bizarro, de padrão talvez esquizotípico, bastante complexo. Fiz um desenho, como sempre sucinto e simplificado, para o tentar entender. O futuro decerto explicará-lho.

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quinta-feira, 26 de setembro de 2024

Da série “da justiça em Portugal”


Em setembro de 2023, quando editei este retrato, ilustrei-o com este texto:

"Então foi assim.

Em 2021, por decisão, do Conselho Superior de Magistratura, Orlando Nascimento, presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, foi suspenso de funções por cento e vinte dias, sem vencimento.

Foi também em 2021 que o mesmo orlandíssimo juiz fez um pedido para voltar a analisar processos na mesmíssima Relação de Lisboa, algo que foi aceite pela presidente deste Tribunal, Guilhermina de Freitas. Assim, para efeitos práticos, este orlandíssimo magistrado continuou em funções.

Acontece que, em Setembro de 2023, o Supremo Tribunal de Justiça, considerando que a alegada infracção disciplinar aplicada ao orlandíssimo juiz estaria prescrita, anulou a decisão do Conselho Superior de Magistratura, que tratou de explicar os efeitos práticos da decisão ao jornal Público, dando-lhe conta de que “tendo sido já cumprida a decisão aplicada”, será “reposta a remuneração”.

Se me acompanharam até aqui, terão entendido, como eu, que o orlandíssimo magistrado Nascimento tem estado a analisar processos na Relação de Lisboa desde 2021 sem ser remunerado.

É de relembrar que o orlandíssimo foi suspenso de funções por 120 dias sem remuneração por, alegadamente (deve-se sempre sublinhar alegadamente) ter estado envolvido na distribuição irregular de processos judiciais no Tribunal da Relação de Lisboa e por - também alegadamente, claro - ter cedido, de forma abusiva, o Salão Nobre desse mesmo Tribunal para julgamentos privados.

Vistos os autos, decidi fazer-lhe um retrato. Fica aqui.

Mas poderia ser pendurado na Relação de Lisboa. Ou até, porque não? no Supremo Tribunal de Justiça. Para memória futura.”

Hoje, segundo uma “história da Agência Lusa” (estas coisas não se inventam) publicada pla TVI, O juiz desembargador Orlando Nascimento, que abandonou em 2020 a presidência do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) na sequência da Operação Lex por alegadas irregularidades na distribuição de processos, foi promovido ao Supremo Tribunal de Justiça (STJ).

A deliberação foi tomada no último plenário do Conselho Superior da Magistratura (CSM) e publicada em Diário da República na segunda-feira, na qual Orlando Nascimento é um dos oito magistrados recém-nomeados para o STJ, já com tomada de posse agendada para 03 de outubro, segundo adiantou o órgão de gestão e disciplina dos juízes.

Entretanto, segundo fonte oficial da PGR ao Correio da Manhã, “A Procuradoria-Geral da República (PGR) confirma que Orlando Nascimento, o desembargador que foi apanhado na 'Operação Lex’ e foi agora promovido ao Supremo, continua a ser investigado pelo Ministério Público em dois inquéritos-crime.

Ou seja, revistos os autos, isto é (numa metáfora futebolística sem exageros alegadamente caricaturais) mais ou menos como se o macaco dos superdragões acabasse de ser convocado para a selecção nacional.
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terça-feira, 24 de setembro de 2024

O espírito santo de Angola



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Álvaro Sobrinho foi acusado de branqueamento agravado.

A Unidade Nacional de Combate à Corrupção da Polícia Judiciária, depois de uma longa investigação, chegou à conclusão comprovada de que o senhor Álvaro Sobrinho transferiu ilicitamente vinte milhões de euros do Banco Espírito Santo de Angola para a SAD do Sporting Clube de Portugal, tornando-se assim um dos maiores accionistas individuais desta sociedade.

Sobrinho é um exemplar de lineu da classe dirigente do “mundo que o português criou” nos trópicos. Um espírito santo luso-tropical.

Este retrato é de 2015. Quando o editei, ilustrei-o com algumas considerações, que republico.

(...) o universo luso-tropical não produziu ainda nenhum espírito universal, nenhuma alma generosa ou genial. As sociedades civis dos países que acederam à independência política com o fim da ditadura portuguesa ainda não geraram nenhum exemplo para o mundo como Mandela, como Wangari Maathai ou como Denis Mukueje; nem o seu universo cultural intelectuais com a dimensão de Soyinka ou Achebe ou Gordimer ou Ki-Zerbo ou Naguib Mahfouz..

Se estas sociedades não têm grande apreço pelas ciências, pelas artes ou pelas humanidades, têm todavia em grande conta outros valores imutáveis, como o dinheiro. E um fascínio indesmentível por quem o possui. Esse é o único valor cultural indiscutível, partilhado por ex-colonos e por “ex-colonizados”.

A verdade é que os países saídos do “mundo que o português criou”, continuaram (e continuam ainda, porque se revêem nele) a copiar o antigo modelo. Quarenta anos após a independência é à capital do antigo império que as suas classes dirigentes, recentemente enriquecidas, vão às compras, ao médico, fazem vultosos investimentos e é nos seus valores que, aí em colégios mui selectos, fazem instruir os seus filhos..

É o caso de Álvaro Sobrinho. Um génio da alta-finança luso-tropical que, doutrinado pelo ex-dono-disto-tudo - o Espírito Santo himself - chegou mesmo a ser o seu preferido..

Dono de uma fortuna de vinte milhões por explicar, dele se diz que, se quisesse, duplicava a sua fortuna só em processos por calúniaDiz-se também que esteve envolvido na transferência de Jorge Jesus para o Sporting - aqui com a colaboração do senhor Obiang, essoutro vulto do universo luso-tropical da cêpêélepê (que também já retratei aqui)..

Além de ser dono do Banco “Valor”, em Angola, Sobrinho também possui a maioria das acções do Sporting Clube de Portugal, do semanário “Sol” e das conservas Bom-Petisco; explora ainda a área comercial do diário "i" e tem um acordo para a sua eventual compra no futuro; também quis comprar a RTP e a SAD do Leixõesfutebolclube, esteve envolvido em vários processos de corrupção, lavagem de dinheiro e gestão danosa e até com a filantropia em África (é presidente do Planet Earth Institute, uma ONG registada no  Reino Unido).”

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domingo, 15 de setembro de 2024

Nuno Melo e a segunda expansão

Prontos.

Tudo indica que, como diz o “jornal” Asbeiras, já “arrancou” a segunda expansão portuguesa.

A primeira começou, como sabeis, em Ceuta, e foi marítima.

Desta vez leva a crer que a coisa será às avessas. Vai ser terrestre.

  • 'bora lá fazier Portugal gránde outrabiez”, terá dito D. Nuno Melo.

Vamos começar por Olivença. A seguir Só parámos em Beladibostóque”, diz que terá dito D. Nuno, para logo a seguir condescender:

  • Prontos, tábenhe, dexemos em Barzóbia pra mijar, carálhos”.