Nelson Fernandes publicou no Face-Book um simples desabafo
que eu penso que daria um belíssimo capítulo de uma História da Figueira da
Foz.
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É que, tal como Fernão Lopes, Nelson também poderia, se quisesse,
encher um ou dois tomos com relatos assim sumarentos de outros episódios igualmente
pícaros e repletos de factos e de protagonistas e de datas exactas e de
documentos irrefutáveis que tudo comprovassem. Seria certamente uma tapeçaria tão
sumptuosa de personagens e acontecimentos como a Crónica de el rei D. João I - só que sem povo nem defenestrações – a Figueira, como é sabido, não tem povo nem público,
ninguém age nem assiste - o que é uma maçada, mas como não se pode ter tudo a gente
adverte-se com o que tem.
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Se Nelson se quiser dar a esse trabalho, eu
ofereço-me já para a ilustrar - graciosamente. Para mim é serviço Público. Tenho
a certeza que seria de grande utilidade para memória futura, sei lá, uma coisa
assim sem tretas nem finas areias nem berço de sereias nem merdas
quejandas, só factos e protagonistas: uma História natural, exemplar e concisa,
colorida e ilustrada da Figueira da Foz e seus contornos e figuras, notórias
e difusas.
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Mas adiante. O texto de Nelson Fernandes
é o que se segue. Aquilatai, pois.
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A FIGUEIRA É DAS ÁGUAS
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A posição do Sr. Vereador Ricardo Silva sobre a
concessão dos serviços de água à empresa Águas da Figueira é uma infantilidade
política, e uma mentira descarada, de que a imprensa local faz eco.
Infantilidade porque sabe que a concessão só pode ser resgatada no final do
contrato. Descaramento porque foi o PSD, partido do qual é presidente da
Concelhia, que fez e prolongou o contrato inicial. Mentira porque desde sempre
a CDU não só se opôs, como sempre denunciou a concessão, sobretudo a iniquidade
vigente em que a empresa paga à Câmara anualmente, pela concessão, trezentos
mil euros, e cobra à Câmara, também anualmente, mais de quinhentos mil euros.
Isto é, um único cliente, o concedente, paga a concessão e ainda sobram mais de
duzentos mil euros. Isto é negócio bem feito, para a concessionária, é
evidente.
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Mas vamos à história:
Nos idos de 1998 o Eng.º Aguiar de Carvalho, no último
ano do seu mandato deixou de acreditar nos totolotos (aeroporto, ou eliminação
de resíduos por pirólise) e converteu-se às privatizações como recurso de
tesouraria, a exemplo aliás daquilo que acontecia nos governos do bloco
central. Vendeu os Serviços Municipalizados de Águas e o Parque Industrial da
Gala. O Parque Industrial da Gala vendeu-se rápido. Só apareceu um comprador, e
era exatamente aquele que se desejava. O Sr. Aprígio Santos.
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Para as Águas o concurso era mais apetecível. A Câmara
tinha acabado de construir e inaugurar a ETA de Vila Verde e a ETAR da Fontela,
o abastecimento estava em cerca de 85%, e, portanto, o investimento para a
cobertura total era residual. O problema estava na rede de esgotos, com uma
cobertura de cerca de 40%, mas para esta, estava assegurado financiamento
europeu, inicialmente a fundo perdido e depois a 75%. Aliás no contrato de
concessão as candidaturas eram da responsabilidade da Câmara. O Eng.º Aguiar de
Carvalho e seus vereadores (Dr. Melo Biscaia, Dr.ª Virgínia Pinto e o Eng.º
Casimiro Terêncio) excluíram do concurso duas empresas, e determinaram um
vencedor, que só não recebeu a concessão porque, as empresas excluídas,
recorreram da decisão de exclusão.
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É sabido que o Eng.º Aguiar de Carvalho não foi o
candidato do PS e que o PS perdeu essas eleições para o Dr. Santana Lopes e
para o PSD. Remunicipalizou o Parque Industrial da Gala, o que foi uma boa
decisão, e anulou o concurso para as águas, abrindo novo concurso, de que saiu
vencedora a empresa que o Eng.º Aguiar de Carvalho tinha excluído. Foi pois o
Dr. Santana Lopes, e os seus vereadores (Eng.º Daniel Santos, Dr.ª Rosário
Águas, Dr. Pereira da Costa, Eng.º Casimiro Terêncio, etc.) que fizeram já em
1999 a concessão definitiva à empresa que se chama hoje Águas da Figueira.
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Este contrato de concessão deveria ter terminado em
2020, portanto este ano. Não terminou porquê? Porque foi prorrogado. A primeira
prorrogação aconteceu porque alguém na Câmara, e não foram os serviços, não
entregou a tempo os documentos necessários para receber a comparticipação da
construção da ETAR de Vila Verde. Foi já o Eng.º Duarte Silva que tirou o
coelho da cartola. Sem dinheiro para pagar a ETAR negociou a extensão do
contrato e o tarifário. Mais um negócio bem feito, para a concessionária, pois
acrescentou anos, creio que cinco, e um tarifário absolutamente leonino.
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O segundo mandato do Eng.º Duarte Silva, é já um
descalabro financeiro de tal ordem que os fornecedores, sobretudo os
fornecedores de obras públicas, já não se candidatavam às obras municipais. E
então muitas dessas obras deixaram de ser ajustadas pela Câmara, e passaram a
ser ajustadas como obras da responsabilidade das Águas da Figueira, tendo como
pagamento um segundo prolongamento da concessão.
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À época são conhecidas as valiosas intervenções do
deputado Municipal do PS Dr. Carlos Monteiro, não contra a concessão,
entenda-se, mas por um tarifário mais ajustado à realidade dos consumidores. A
negociação já com o Dr. Carlos Monteiro como vice-presidente da Câmara fez-se,
mas os resultados tal como os conhecemos hoje são pífios. A Figueira da Foz
continua a ter dos tarifários mais caros do país.
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A solução é mesmo não renovar a concessão e voltar aos
Serviços Municipalizados. Mas ninguém de boa-fé acreditará que o PSD, (e já
agora também o PS) uma vez no poder determine o fim da concessão. Na realidade
está na moda substituir a «quadratura do círculo» pela «circulatura do
quadrado». Mas com os mesmos protagonistas só são de esperar os mesmos
resultados. As privatizações (com ou sem «regulador»), como diria o escorpião
ao coelho antes de o morder, é que são a sua natureza.
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À parte. Fez-me bem este bocadinho de história.
Desabafei!
Nelson Fernandes
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