Este abantesma - sobre o qual já me debrucei aqui - deu de novo um ar da sua graça. Esta
contradição viva (ele é um intelectual-cavaquista,
vejam bem) a quem o governo ofereceu agora um feudosinho à medida, acaba de
privatizar a língua portuguesa; o ex-comissário de quase-tudo travestiu-se numa espécie de Maria da Fonte das consoantes mudas comovendo
assim, com este sobressaltozinho cívico de opereta, uma vasta colecção de
idiotas que escrevem nos jornais e transformou o debate entre os prós e os contras acordo ortográfico numa inaudita e imbecil guerra entre
esquerda e direita.
.
A verdade é que o acordo
ortográfico nem sequer é uma questão política - é um aborto sem pés nem cabeça. Mas para que se veja a que ponto
chegou a idiotia nesta choldra, uma das suas maiores faculdades de Letras, a de Lisboa, ainda
não tem opinião oficial sobre o assunto.
.
.
Contudo, no que me diz respeito, continuarei a escrever como
até aqui. Quanto a ler, cheguei a uma idade em que quase só releio (para tal
basta-me, ai de mim, metade do que foi editado até hoje) e deixei de comprar
jornais (o que neles me dificulta a leitura não é a ortografia, é a estupidez e
a desonestidade). Além disso, confesso que, apesar da “umidade” e da “anistia”,
leio sem maiores dificuldades qualquer texto brasileiro.
.
Enfim, reconheço que me
preocupam bem mais outros acordos. Mas também reconheço que a claudicação neste,
como no laboral e no da troyka, por exemplo, indicia que a tendência
dos portugueses para se inclinarem, resignados ou abúlicos, perante os diktats do dinheiro, chama-se declínio - como referiu esta semana um tal de Shultz, para grande escândalo
das alminhas patrióticas.
.
1 comentário:
Bem, dito. Subscrevo de alto a baixo.
Enviar um comentário