A maior infelicidade para um artista é ter um adversário sem talento Denis Diderot
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Apesar da minha confessada misantropia, gosto de me manter informado sobre os “causos” que vão acontecendo aos meus semelhantes mais próximos.
Por isso quando desço à vila, por tabaco ou por carvão, invariavelmente entro no café. É aí que leio os jornais regionais e me informo das novidades. É claro que, de entre a pilha de exemplares disponíveis sobre o balcão, quase todos são antigos e desactualizados. Mas eu leio tudo (informação desactualizada não é poder, é apenas saber) e não me importo, gosto de acumular conhecimento.
Foi aí que encontrei, num exemplar do diário “As Beiras” de 16 de Julho, uma entrevista com Beja da Silva, um marchand (negociante) de tableaux (mercearias finas), que me deixou varado.
Por isso quando desço à vila, por tabaco ou por carvão, invariavelmente entro no café. É aí que leio os jornais regionais e me informo das novidades. É claro que, de entre a pilha de exemplares disponíveis sobre o balcão, quase todos são antigos e desactualizados. Mas eu leio tudo (informação desactualizada não é poder, é apenas saber) e não me importo, gosto de acumular conhecimento.
Foi aí que encontrei, num exemplar do diário “As Beiras” de 16 de Julho, uma entrevista com Beja da Silva, um marchand (negociante) de tableaux (mercearias finas), que me deixou varado.
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O que no meu caso é natural - abrir parênteses: (dizem que à simples menção da palavra “marchand”, Picasso vociferava: “voilá l’ennemi!”. Artistas e marchands nunca se entenderam sobre conceitos económicos tão básicos como “preço” e “valor”. Há mesmo uma história, que muitos pretendem verídica, e se terá passado entre Picasso e Rosenberg (o avô de madame Strauss-Khan) que ilustra este facto: certo dia, Picasso, pretendendo vender algumas das suas obras, discute o assunto com o seu marchand. Bastante animado, o marchand perguntou por quanto Picasso venderia uma delas e, ao ouvir a resposta do pintor indagou sobre o seu valor, achando-a acima do preço de mercado. Picasso imediatamente retrucou dizendo que a obra valia o que ele pedia e que “preço” era diferente de “valor”. Foram discutindo a questão por alguns minutos até que, irritado, o marchand replicou que ele não percebia nada de negócios e que lhe explicaria como funcionava. Então, puxou uma nota de um dólar do bolso, mostrou-a ao pintor e disse: — Está a ver aqui, mestre!? Está escrito um dólar! Isso significa que esta nota vale um dólar! Picasso pegou na nota, autografou-a e em seguida perguntou ao marchand: — E agora, quanto vale?). Fechar parênteses.
O que no meu caso é natural - abrir parênteses: (dizem que à simples menção da palavra “marchand”, Picasso vociferava: “voilá l’ennemi!”. Artistas e marchands nunca se entenderam sobre conceitos económicos tão básicos como “preço” e “valor”. Há mesmo uma história, que muitos pretendem verídica, e se terá passado entre Picasso e Rosenberg (o avô de madame Strauss-Khan) que ilustra este facto: certo dia, Picasso, pretendendo vender algumas das suas obras, discute o assunto com o seu marchand. Bastante animado, o marchand perguntou por quanto Picasso venderia uma delas e, ao ouvir a resposta do pintor indagou sobre o seu valor, achando-a acima do preço de mercado. Picasso imediatamente retrucou dizendo que a obra valia o que ele pedia e que “preço” era diferente de “valor”. Foram discutindo a questão por alguns minutos até que, irritado, o marchand replicou que ele não percebia nada de negócios e que lhe explicaria como funcionava. Então, puxou uma nota de um dólar do bolso, mostrou-a ao pintor e disse: — Está a ver aqui, mestre!? Está escrito um dólar! Isso significa que esta nota vale um dólar! Picasso pegou na nota, autografou-a e em seguida perguntou ao marchand: — E agora, quanto vale?). Fechar parênteses.
Segundo Jot’Alves, o entrevistador, Beja da Silva é o feliz proprietário de uma galeria de arte que é “um ícone no panorama das artes plásticas da região Centro”. Além disso, ainda segundo o entrevistador (ele próprio um ícone de um certo jornalismo, digamos, dedutivo), Beja da Silva é “galerista a tempo inteiro há mais de vinte anos” e faz isso desde pequenino quando, aos doze anos, descobriu que não tinha talento.
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-Mas não foi isto que me espantou. Acho até natural que um comerciante possa fazer da arte um modo de vida “a tempo inteiro”; sobretudo numa região onde os artistas “a tempo inteiro” se podem contar pelos dedos de uma mão e onde não existem hábitos esclarecidos de fruição cultural ou sequer crítica de arte. Bate certo. Confirma o real aggiornamento da Figueira em relação ao país: em Portugal, essa pátria de desempregados que aniquilou actividades realmente produtivas como a agricultura, as maiores fortunas pertencem - como toda a gente sabe - a grossistas de mercearia.
-Mas não foi isto que me espantou. Acho até natural que um comerciante possa fazer da arte um modo de vida “a tempo inteiro”; sobretudo numa região onde os artistas “a tempo inteiro” se podem contar pelos dedos de uma mão e onde não existem hábitos esclarecidos de fruição cultural ou sequer crítica de arte. Bate certo. Confirma o real aggiornamento da Figueira em relação ao país: em Portugal, essa pátria de desempregados que aniquilou actividades realmente produtivas como a agricultura, as maiores fortunas pertencem - como toda a gente sabe - a grossistas de mercearia.
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-O que provocou a minha perplexidade foi o que Beja disse a seguir (isto segundo o dedutivo entrevistador): que na Figueira “o problema está na classe média…” e tal e que “não há muitas empresas a investir em arte”. Mas que, fora disso, o mercado (da arte) continua, como se diz na têvê, em alta, ou com sentimento positivo, ou lá o que é; a conjuntura não afectou nem a oferta, nem a procura, nem o preço, nem o valor. Ou seja, “Os quadros bons vendem-se todos. Há cada vez mais pessoas a investir em arte, independentemente de gostarem ou não da obra. É uma forma de investimento.
-O que provocou a minha perplexidade foi o que Beja disse a seguir (isto segundo o dedutivo entrevistador): que na Figueira “o problema está na classe média…” e tal e que “não há muitas empresas a investir em arte”. Mas que, fora disso, o mercado (da arte) continua, como se diz na têvê, em alta, ou com sentimento positivo, ou lá o que é; a conjuntura não afectou nem a oferta, nem a procura, nem o preço, nem o valor. Ou seja, “Os quadros bons vendem-se todos. Há cada vez mais pessoas a investir em arte, independentemente de gostarem ou não da obra. É uma forma de investimento.
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Decididamente, tal como a Picasso, há na economia demasiadas nuances que me escapam. E, no meu caso, até na arte; o que, helas, provoca (juntamente com outros problemas que tenho com o mercado, como já expliquei aqui) uma continuada revisão, em baixa, da minha cotação.
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Mas para além disso, e digam lá se isto não é realmente extraordinário, apesar de no país ninguém ter dado por nada, na Figueira já começou a retoma. Olé.
Mas para além disso, e digam lá se isto não é realmente extraordinário, apesar de no país ninguém ter dado por nada, na Figueira já começou a retoma. Olé.
E pela arte. Beja da Silva é o seu profeta.
Vai já para o meu Álbum Figueirense. Aqui ao lado, na prateleira, junto dos outros cromos.
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