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quinta-feira, 31 de dezembro de 2020

Discurso sobre a Figueira


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Todos os homens discorrem sobre o que sabem, ou o que presumem. Giovanni Pico della Mirandola, por exemplo, discorreu sobre a Dignidade do Homem. Descartes sobre o Método. Étienne de la Boétie sobre a Servidão Voluntária. Jean-Jacques Rousseau, que presumia sobre uma data de assuntos, discorreu sobre A origem e Fundamentos da Desigualdade entre os Homens, mas também sobre As Ciências e as Artes.

Eu próprio, não desfazendo, também presumo a respeito das mais diversas matérias. Tenho, contudo, vindo a debruçar-me especificamente sobre apenas uma, que tão logo se transformou no meu objecto preferencial de observação, curiosidade e contemplação. De maneiras que depois de mui atento estudo e concomitante conhecimento acumulado, também me permiti discorrer longamente a propósito, em obra escrita. Ou seja, como uma ostra no fim do seu confinamento, também acabei por soltar a pérola que hoje, finalmente, no último dia deste ano miserável, tenho a honra de vos apresentar, em forma de Discurso público.

Este Discurso sobre a Figueira e por extenso Execração dos Figueirinhas foi pacientemente composto nos últimos trinta dias, ainda que sustentado em inúmeros apontamentos, reflexões e considerações editadas neste mesmo blogue ao longo de vários anos. O confinamento a que a pandemia a todos tem obrigado proporcionou-me o tempo de os reunir, escolher, corrigir, acrescentar, burilar, ilustrar e colorir; mas também me permitiu a reflexão e o distanciamento necessários para escolher a forma e o tom que julguei apropriados para compor e dar um sentido mais do que vagamente estruturado à sumula de tudo o que reuni sobre assunto tão espinhoso, ainda que suculento.

Assim, este Discurso tomou a forma de um panfleto sarcástico e o tom despretensioso de um Divertimento, essa composição musical (para um número reduzido de instrumentos, de caráter ligeiro e tom casual e alegre, que possui uma quantidade livre de movimentos, semelhante às suítes sem, porém, seguir um padrão pré-determinado), tão em voga no século XVIII. 

Como tal, e como não morigera nem desmoraliza, todo o texto deste panfleto, os seus vários àpartes e os diversos movimentos, incluídas as suas sumptuosas ilustrações metafóricas, foram compostos e editados por mim no espírito libertino e licencioso desse magnífico século iluminado pela fantasia e pelo livre-pensamento. O texto, da primeira (que reproduzo acima) à última das suas trinta páginas, foi composto e paginado com caracteres da família Trajanus Roman, redesenhados em 1993 por Roger White.

Muito mais do que uma simples edição de autor, trata-se de um verdadeiro livro d’artista com a edição limitad(íssima) de apenas 25 múltiplos, exemplares únicos e irrepetíveis (não será feita outra edição) que serão todos numerados e autenticados pela minha assinatura manuscrita.

Cada um destes múltiplos será um raro objecto de desejo, de puro deleite, de selecta colecção, que sei eu, uma verdadeira música de câmara, acessível apenas a espíritos sofisticados e exigentes como os privilegiados happy few que visitam este blogue e que o desejem encomendar, pelo módico preço que eu vier a fixar, mais custos de envio, através do endereço de e-mail que está aqui na barra lateral.

Aqui chegados, os meus leitores mais dedicados já se devem ter apercebido que estou metido num lindo molho de brócolos: acabei de escrever um livro sobre uma terra que não interessa a ninguém, nem mesmo a si própria, posto que não lê.

Vendo-me por isto mesmo contrito a recorrer à generosidade, ou à curiosidade, dos meus leitores de todo o mundo (apesar do seu alcance residual, também tenho plena consciência de que este blogue é acedido desde os lugares mais remotos e difíceis de pronunciar) posso desde já afiançar-lhes, sob palavra de honra e para mal dos meus pecados, que este pequeno panfleto insignificante tem tudo o que basta para se tornar um Clássico. Isto, claro, se ser um Clássico for a capacidade de alcançar o Universal partindo do muito particular, ou mesmo do insignificante. Foi o que fez Euclides da Cunha com um arraial remoto nos sertões da Bahia, e Garcia Marquez com um lugar recôndito da sua imaginação. Gogol fez isso com um simples nariz. E eu, deus me perdoe, acabo de o fazer com a Figueira da Foz.

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2 comentários:

cid simoes disse...

ONDE E COMO POSSO ENCOMENDAR O LIVRO?

Antonio Carvalho disse...

Onde é como se pode encomendar o livro?