É sabido que na arte islâmica é proibida a representação de
Deus. É por isso que esta arte é abstracta. O que eu não sabia era que em
Portugal, no ano vinte do século vinte e um, era proibido desenhar polícias.
Ainda mais no seu habitat se não natural pelo menos num ambiente
em que qualquer cidadão, jornalista ou simples mirone, pode observá-los: não a
fazer o seu trabalho de segurança pública mas como participantes activos
(e bem participativos) em alegres hápeningues de extrema-direita.
Como não acredito que seja verdade (que é proibido desenhar
polícias) resolvi fazer o retrato do senhor Magina da Silva, o afoito director
(ou presidente, ou cê-i-ou ou comandante supremo ou lá o que é) da dita
instituição. Foi ele que assinou uma queixa-crime contra o cartunista Nuno Saraiva
porque este desenhou um agente da polícia numa manifestação nocturna de fachos acesos
e máscaras brancas. Ou seja, o pobre nem sequer usou a fantasia e o exagero
(que nesta arte são perfeitamente aceitáveis) limitando-se a ser literal: representou
um agente da PSP no seu ambiente natural quando está de folga (quando de
serviço estará certamente a bater em pretos, a ameaçar ciganos ou a multar
desgraçados atrasados para o trabalho).
Eu penso, contudo, que em vez de se sentir melindrado por
agentes da PSP serem representados a participar de mitingues fascistas,
o comandante Magina devia tomar providências para evitar que eles os
frequentassem. É para isso, suponho, que ele tem o comando da força
toda.
Também penso, já agora, que o comandante também devia tomar
providências, ou mover influências sei lá, (junto da tutela) para que os
seus agentes sejam melhor remunerados de modo a que, para arredondar o
orçamento, não se vejam obrigados a fazer serviços de segurança privada. Se não
lograr o intento devia, pelo menos, ser inflexível quanto à indumentária - aconselhar-lhes
o informal: bata ou avental - nunca a farda de serviço e o equipamento. Mas é
assim, infelizmente, que qualquer paisano, jornalista ou simples mirone, pode
observá-los nas lojas do Pingo-Doce da Figueira da Foz: patrulhando impávidos os
corredores, passeando vagarosa e ameaçadoramente as botas do regulamento, a
farda, a pistola, o cassetete e as algemas, que exibem, ostensivas, para pavor
dos ciganitos e eterna segurança do pecúlio de chocolates do senhor Soares dos
santos (que não é deus nem eu muçulmano e por isso mesmo também já me permiti
representar figurativamente aqui).
É que, como cidadão e contribuinte, sinto-me melindrado.
Tão melindrado que, se acreditasse na justiça, moveria uma queixa-crime contra
o chefe da polícia.
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