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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

A cultura da política





A verdade é um pouco mais complexa e é uma questão de cultura política.
Ou mesmo de cultura. Geral.
Na relação entre os mundos da política e da “cultura” existem tradições distintas, consoante o político (no poder) é de “direita” ou de auto proclamada “esquerda”.
No caso da “direita”, o exemplo paradigmático é sem dúvida o de Rui Rio, para quem artistas e outros agentes da “cultura” não passam de uns chulos do erário público, os chamados subsidiodependentes. Argumento que colhe, diga-se que com alguma razão, junto das massas populares para quem, vistos de baixo, os que estão próximos da mesa do banquete lambendo as mãos aos convivas são os que se aboletam com as melhores migalhas. Este político, por exemplo, prefere o apoio discreto e “desinteressado”, que aliás generosamente retribui, de artistas de gosto popular como La Féria do que o de “elitistas” como Pedro Burmester. A peculiar visão política de Rio não lhe permite aliás distinguir nenhuma diferença substantiva entre Burmester e Abrunhosa. Estes políticos têm uma concepção economicista da cultura. Como alguém disse a propósito de Rio: “quando ouve falar em cultura puxa logo da calculadora.”
Já na auto-proclamada “esquerda”, a estratégia é completamente distinta mas igualmente oportunista. Este tipo de políticos, cujo paradigma é António Costa, gosta de se rodear de “artistas” de méritos reconhecidos, cujo apoio público ostenta à lapela principalmente durante as campanhas eleitorais, esperançado que caia sobre si algum do suposto “prestígio” daqueles vultos das artes ou do pensamento.
Esta estratégia funciona tanto melhor quanto a popularidade do artista apoiante for socialmente notória (veja-se o caso da cedência, pelo município, da Casa dos Bicos à Fundação Saramago e o da atribuição de um subsídio para um filme sobre o casamento do escritor e do subsequente apoio político do escritor comunista nas últimas eleições autárquicas). Ao contrário dos da “direita”, este tipo de políticos “quando ouve falar num apoio de um notável da Cultura, puxa logo do livro de cheques”.
Deduzo que seja nesta segunda classe que se inscreve o nóvel poder autárquico figueirinhas com uma das suas primeiras medidas estruturantes tão prestimosamente anunciadas pelo blogue do meu amigo Agostinho: por proposta do novo vereador da Cultura (uma espécie de António Ferro do nouveau régime), a Câmara Municipal deliberou atribuir uma palmada nas costas, perdão, um voto de louvor a um galardoado realizador de documentários.
Devo dizer que, ao contrário do meu amigo Agostinho, a minha posição relativa a estas duas “mundivisões” é equidistante: talvez devido à minha assumida misantropia, sempre me foi fácil manter uma distância sanitária entre mim e uma vasta gama de cretinos, à esquerda e à direita. É evidente que com custos óbvios. Mas ninguém tem nada a ver com isso.
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o desenho acima não é inédito. No jornal "A linha do Oeste" servia de cabeçalho a uma rubrica que destacava afirmações dos políticos na campanha eleitoral de 1997.
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