.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

escândalo



A todas as almas que se escandalizam pelo regresso do pudor, da hipocrisia e do medo, a propósito de mais este episódio patético, uma história exemplar:

quando o velho Buonarrotti deu a última pincelada na vetusta parede da capela Sistina, aquilo era uma exuberante desorganização à alentejana. Desde Deus himself, até ao mais anónimo dos diabinhos, estavam todos em pêlo. Roubos, estupros, assassinatos, etc, tudo representado au naturel! Que belo programa para a parede da capela-mor da cristandade! Só após a morte do velho e ousado artista é que um Papa anónimo mandou um aprendiz piedoso pintar uns paninhos à frente das vergonhas. O Juízo Final não era esta espécie de bacanal pífio disfarçado de festa de pijama que os crentes vêem pela televisão de cada vez que o Pontífice vem perorar contra a intolerância dos outros. Não! Era uma coisa muito mais hard. Confrontava directamente os cristãos com o seu próprio corpo, o seu arbítrio e a sua mortalidade. Foi censurado. A obra programática da contra-reforma foi censurada em casa, e mais, amputada ao ponto de não parecer hoje mais do que uma caricatura, muito apreciada por fieis cretinos e por turistas americanos.
E uma caricatura amarga e também irónica é que 500 anos depois, uma insípida Vénus nacarada de Lucas Cranach o velho, (que foi amigo de Lutero e autor da primeira iconografia do austero protestantismo), foi censurada num subterrâneo em Londres, ao abrigo de um desenterrado código moral vitoriano, com a justificação cínica e piedosa de "não ofender os passageiros multiculturais do metro".
Apetece cantar com esse honrado libertino, Jonh Lennon: “God shave the Queen!...”
.

.

.

Sem comentários: