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Na minha aldeia
não há ódios, mas estimas
tem-se amor pela vida alheia
todos são primos e primas
Silva Tavares
não há ódios, mas estimas
tem-se amor pela vida alheia
todos são primos e primas
Silva Tavares
Há quase um ano publiquei aqui um texto no qual, a
propósito do infeliz estado de indecorosa bizarria em que se encontra o Forte
de Stº Catarina, exprimi algumas perplexidades em relação ao peculiar apreço
pelo património que nutrem as forças vivas figueirinhas. Como parece que
só eu reparo em certas merdas (ou,
pelo menos, só eu o escrevo, tornando públicas as minhas perplexidades)
não estranhei que não fossem partilhadas por mais ninguém, nem na imprensa
local nem nas redes sociais. Se mais ninguém se indigna, é porque estará tudo
bem. Eu é que devo ser demasiado hiper-sensível à fealdade e à estupidez.
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Quase um ano depois, porém, tudo indica que essa
perplexidade não é apenas minha - chegou finalmente à assembleia municipal,
pela boca da deputada Maria Isabel Sousa, do PSD.
Pelos vistos a deputada também partilha a minha estranheza
perante essa espécie de inimputabilidade vitalícia de que goza o indescritível
Tennis Club da Figueira da Foz. Arrendatário do terreno anexo ao forte de Stº
Catarina desde 1930, este imarcescível club particular comporta-se na
realidade como o proprietário, um proprietário abusivo, que faz obras (sempre
de utilidade discutível e invariavelmente de gosto duvidoso) na casa do
vizinho, um monumento nacional. E faz isto diante de todos, a toda a hora, sem
licença mas com autorização e impunidade, desde os mesmos anos trinta do século
passado.
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Mas talvez tudo isto se explique porque este inenarrável club,
de cunho muito mais recreativo do que propriamente competitivo, é um club
selecto, mui selecto – exclusivo - de boas famílias, enfim as melhores,
da classe dirigente local. E como entre primos e primas o privilégio do
mando é hereditário e natural (como a diabetes, as pratas e o
mau-feitio) a presidenta do club é Joana Aguiar de Carvalho, filha do
antigo presidente da Câmara com o mesmo apelido.
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E como na Figueira não há ódios mas estimas, se o
pai foi agraciado com um busto à porta do município - depois de ter entregue a
cidade numa bandeja à cupidez dos patos bravos da construção civil - a filha
também.
Também foi agraciada - com um lugar no Conselho
Municipal de Turismo, em representação da Assembleia Municipal, da qual nem
sequer faz parte. Presumo que os serviços prestados pelo club a
que preside não hão de ter sido estranhos a tão notória distinção. Assim como o
facto, não despiciendo, de ter sido administradora desse ícone da
administração pública figueirinhas que foi a Figueira-Grande-Turismo.
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Na Figueira, a minha aldeia neste país paroquial e
imemorial, quem realmente manda premeia sempre quem realmente se distingue, e mainada.
No mais, tem-se amor pla vida alheia. E todos são primos e primas
- ou tios e tias - ou padrinhos e afilhados. E fica sempre tudo
bem.
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2 comentários:
Muito bom . Olhe que cada vez mais as pessoas se vão insurgindo contra o situacionismo latente na figueira .O forte e agora as obras ao lado do ténis são o exemplo do que não se deve fazer mas há grupos que se acham no direito de serem DDT .
Quis partilhar e o face não deixa porque houve pessoas que denunciaram como tendo conteúdos abusivos .
Excelente a escrita, a notável ironia, a acutilância elegante, mesmo que possa não acompanhar nalgumas críticas.
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