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quinta-feira, 22 de outubro de 2009

Reflexão sobre alguns conceitos seguida de uma OPV (oferta pública de venda)


O pintor Rolando Sá Nogueira, com quem há muitos anos, na Cooperativa Árvore no Porto, tive aulas de desenho, dizia, do alto dos seus quase dois metros, que um dos principais requisitos de um desenhador é a capacidade de observar. No meu caso, penso que esta faculdade é mais inconsciente e reflexiva do que racional e contemplativa. Talvez por isso os meus desenhos sejam algo arrevesados ou distorcidos, parciais, característicos daquilo a que se chama uma visão pessoal.
A minha compulsão para a observação reflexiva tem-me levado mais à perplexidade do que a qualquer espécie de convencimento ou confirmação de ideias pré-concebidas.
À medida que envelheço, a progressão da minha miopia tem-me privado da beleza dos pormenores mais longínquos mas dotou-me de uma visão global mais alargada e generosa (mais adivinhada do que efectiva, eu sei); o meu olhar foi-se tornando céptico, quiçá cínico, incapaz talvez do deslumbramento, mas ainda não do espanto.
Embora atento ao rumor do mundo também o estou em relação ao meu quintal. Neste, as primeiras borrascas do Outono revelaram fenómenos caprichosos. O ninho da foto acima, derrubado pelos ventos outonais do alto de uma das minhas nespereiras, depois de atentamente observado, reservou-me estranhas perplexidades:
- Terão os pássaros de Maiorca dado um passo de gigante na evolução das espécies ao introduzirem o ornamento na concepção (design) dos seus habitáculos? Isso seria a descoberta científica do século, pensei até enviar a foto à National Geographic - a minha filha, que fotografou o fenómeno, é assinante desta revista - mas depois de reflectir ponderadamente desisti de me expor ao ridículo. Uma observação mais atenta e uma mais aturada reflexão permitiram-me deliberar que os melros de Maiorca devem andar apardalados. Confundem conceitos. É mais do que óbvio que, tal como Catarina Pestana, nunca leram Bruno Munari. Desconhecem a distinção nítida entre artista e designer. Coitados, tal como a “designer” portuguesa, eles não fazem a mínima ideia que existe uma “diferença substantiva” entre design, arquitectura e arte.
- Ou talvez não.
É bem possível que os pássaros de Maiorca estejam indignados com a poluição e com a dimensão da estupidez humana e talvez este ninho seja “uma peça de comunicação”, enfim, um exemplo daquilo a que talvez também chamem “design emocional”.
O comendador Berardo, o mecenas dos conceitos apalermados, não o quererá adquirir para a sua colecção particular? - Eu faço um preço muito em conta.
Assim tudo faria mais sentido.

1 comentário:

CS disse...

Do texto ao bird songs é um prazer.