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sexta-feira, 8 de junho de 2007

auto-retrato, 1985

(acrílico s/papel s/aglomerado, 100x83)
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aqui abordei as questões da auto representação. Desta vez, retomo o tema, a propósito deste, que julgo ser o meu primeiro auto-retrato. Tinha 23 anos, algum talento, muita ingenuidade e pouca paciência.

E mostro-vos, de Giorgio de Chirico, (um pintor fascinante, de quem vos falarei um destes dias), um autoritratto que eu não conhecia e descobri na net recentemente, para que o compareis com o meu (não é pretensão, é desvario!) nas suas analogias e no nosso comum enlevo com as virtualidades da dupla auto-representação.


Mas o que leva o artista a auto-retratar-se? A vaidade? O orgulho? Porquê a necessidade de criar essa espécie de versão oficial de si próprio?

O pintor sabe, por dever de ofício, que as imagens não são apropriáveis, isto é, têm sempre sentidos incontroláveis. Aí está toda a história da arte, das ideias e da comunicação para o demonstrar (porquê o horror que todos os totalitarismos e cultores do absoluto manifestam pela imagem representada?)

Como alguém disse, toda a puta, mesmo velha, tem as suas ingenuidades. O artista (sobretudo quando jovem, mas não só) também tem os seus pueris devaneios de “controlo” sobre as imagens que produz.

Eu creio que o verdadeiro motivo dos grandes auto-retratos da história da arte é a própria Pintura, num ensejo, patético e vão, de controlo sobre os sentidos da sua própria (auto) representação.
As Meninas, de Velásquez, por exemplo, ao qual Luca Giordano chamou a teologia da pintura, travestido de muitas outras intenções, o “melhor quadro do mundo”, é também o mais espampanante auto-retrato do mais modesto dos pintores.

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Ah, e deixo-vos uma referência crítica a este meu quadro, publicada em 1985 num jornal da Figueira da Foz, por alguém que não conheço mas a quem agradeço, onde quer que esteja, (ainda vai a tempo) a benevolência e a vista grossa.
Um caso à parte é Fernando Campos, apresentando três quadros que imediatamente se impõem ao olhar mais distraído, ao revelar um domínio sólido dos processos da cor e da forma, mais evidente talvez no fascinante auto-retrato em que a imagem do artista se metamorfoseia no seu fantasma enquanto das manchas de cor surgem timidamente as flores – o verdadeiro retrato de um auto-retrato.”
Vicente Neto in O Figueirense, 5/7/85
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