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sexta-feira, 26 de abril de 2019

O engraxócagadismo implacável


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entre os animais ferozes,
o de mais poderosa mordedura é o delator;
entre os animais domésticos, o adulador.
Diógenes
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José Cunha Carvão é o nome do presidente da Assembleia de Freguesia de Maiorca. Mas parece acabado de sair, fresco como uma alface, repolhuda e reluzente, das brumas da memória ainda frondosa de um Portugal da idade-média ou do estado-novo. Carvão é o “doutor” da terra (é professor de geografia no instituto D. João V) e, como tal, é muito considerado e reverenciado por, enfim (quase) todos os seus paisanos. Todas as aldeias deste Portugal imemorial têm um assim e não só nas novelas de Aquilino.
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Embora tenha sido eleito nas listas do PS (Partido Socialista) ou talvez por isso, José Carvão representa aquilo que de mais reaccionário persiste ainda e sempre no Portugal profundo. Cunha Carvão encarna, com airosa propriedade, aquele atávico temor de Deus, aquela devoção beata plas santas tradições populares e aquele respeitinho servil por tudo o que vem de cima que caracterizam toda uma casta de doutores-de-coimbra-meudeus que ainda presidem, em vilas e aldeias por todo o país, a assembleias de fregueses que ainda praticam, com o mesmo airoso e pertinaz sem preconceito, o analfabetismo mais irredutível.
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Por isto, na mais recente sessão da assembleia, em lugar de, como lhe compete, fazer cumprir uma proposta do eleito da CDU aprovada por maioria absoluta há três ou quatro assembleias atrás (adquirir um zingarelho para gravar as intervenções dos eleitos do povo) assim cuidando que as actas das sessões sejam transcritas com alguma fidelidade, de preferência sem erros de ortografia, José Carvão, em modo melífluo e embaraçado, de solícito e feliz engraxa-o-cágado decidiu propor, decerto a pedido de várias famílias, uma espécie de moção de desagravo, voto de louvor ou menção honrosa ou lá o que era, ao xelentíssimo senhor doutor João Ataíde das Neves que tanto fez pla freguesia e agora nos deixou para secretário d’estado.
Perante a ausência massiva de quase toda a bancada do PSD (o seu único representante presente, fleumático ou distraído, algo blasé, receio que levemente ensonado, não me pareceu particularmente entusiasmado) o eleito da CDU chutou para canto - sugerindo-lhe a moção por escrito, em assembleia a realizar.
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De modos que na próxima assembleia, os eleitos do povo de Maiorca terão certamente o privilégio de votar (e os paisanos de assistir) à leitura em alta-voz da prosa encomiástica (se for em verso será uma ode, só espero que não seja cantada) de José Cunha Carvão em louvor do xelentíssimo e diligente autarca que ofereceu a Maiorca a inauguração do restauro do senhor da Paciência (aprovado pelo seu antecessor); a concretização de um projecto “fechado” (sem discussão pública) de arranjo urbanístico do Largo da Feira Velha; nenhuma solução para o restauro e posterior utilização do palácio do conselheiro Lopes Branco e idem idem aspas aspas para o Paço - além do abate despropositado das carvalheiras do campo da bola e das excelsas podas nas árvores ornamentais, claro.
Decerto irá para os anais. Isto, como é óbvio, se entretanto já houver gravador para a sessão - e consequentemente, actas fidedignas do acontecimento.

2 comentários:

Guida disse...

Para sua informação o Restauro da Capela do Divino Sr Da Paciência foi mandado fazer e Pago pela comissão da capela (contributos do paroquianos). A zona envolvente é que foi financiada pela Câmara. Os paroquianos agradecem aos excelentíssimos EX-presidente da Câmara Engenheiro Duarte Silva e ao Ex-presidente presidente da junta de Antonio ligeiro e pelo empenho da comissão da capela . O senhor quando crítica os Maiorqueses que têm provas dadas do que já fizeram por Maiorca ,mostre o Sr o que já fez em prol da Freguesia que ao Sr não deve dizer muito. Disse.

fc disse...

Cara Guida,
vejo pela sua redacção que sabe escrever, bastante satisfatoriamente aliás. Receio porém que talvez não saiba ler, ou pelo menos que não o pratique demasiado.
Contudo, se o tentar fazer outra vez, devagar, do princípio, pausadamente (e pode repetir as vezes que quiser) há-de poder constatar que em nenhuma parte do texto se refere quem fez o que quer que seja (embora tenha ressalvado precisamente o caso do Santuário em questão atribuindo-o precisamente "ao seu antecessor"); pelo contrário, o texto refere precisamente quem NÃO FEZ.
Também há-de poder constatar que em nenhuma parte do texto se critica "os maiorquenses",nem se escamoteia o mérito ou a a obra feita de quem quer que seja. Se me permite explicar o conteúdo (o que acho tristemente redundante mas visivelmente necessário), o assunto da posta é precisamente sobre a pretensão de atribuição de méritos a quem manifestamente não os merece.
Quanto ao resto, embora, como a senhora, eu também seja maiorquense, não sou um benemérito (a benemerência está infelizmente muito acima das minhas possibilidades) mas considero, ainda assim, humildemente, ter direito a manifestar opinião sobre a terra que habito e onde pago os meus impostos.
É óbvio, minha senhora, que toda a gente pode discordar do que escrevo. Também se pode, claro, discordar do que não escrevo. Mas conceda-me o direito de achar estúpido.
Atenciosamente,
Fernando Campos