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sábado, 23 de setembro de 2017

O gigante e os anões

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Este ano, na Figueira, o dia da cidade coincidiu com um dia normal de campanha eleitoral. O geniozinho imbecil que coordena a campanha autárquica do Partido Socialista na Figueira da Foz deve ter tido uma erecção. O seu cerebrozinho de apenas um neurónio fez tilt (terá mesmo ejaculado, ou evacuado, por qualquer das extremidades) de auto-satisfação, por ter notado a feliz coincidência. E, num lampejo de esperteza saloia, arresolveu assinalá-la com uma série de inaugurações, entregas de prémios e homenagens públicas a personalidades locais. É verdade, a Câmara Municipal não arranjou melhor oportunidade para homenagear o escultor Gustavo Bastos, o escritor João Gaspar Simões, o arquitecto Isaías Cardoso e o político e advogado Luís de Melo Biscaia.

Por mero acaso assisti à que foi prestada a Luís de Melo Biscaia. Tratava-se de dar o seu nome ao largo onde teve o escritório de advogado por mais de quarenta anos.
Foi assim. Ia eu muito descansado a passar pla rua da República quando reparei, em frente ao Café Nau, num ajuntamento inusitado de engravatados. Logo depois, lobriguei a presença das duas corporações de Bombeiros. Juntos, os Municipais e os Voluntários. Hmm. Farpelas de gala. Estandartes ao alto. Hmm, pensei eu baixinho, aqui há coisa. Acerquei-me. Deparei, entre os mirones, com algumas caras conhecidas. Deixei-me estar. Mirei. E não gostei.
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Suponho que o próprio Melo Biscaia também não teria gostado.
Apesar do belo, digno e emocionado discurso do seu filho Pedro, Melo Biscaia teria com certeza torcido o nariz à ideia peregrina de ver o seu nome servir de pretexto para um tão óbvio como reles aproveitamento político em campanha eleitoral.
Mas o pior veio depois. Melo Biscaia, se tivesse assistido a tão penoso sacrifício teria, sem dúvida, franzido o sobrolho e arranjado motivo para se despedir à francesa, embaraçado, para ir fumar uma das suas longas cigarrilhas bem longe dali.
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A pièce de resistance da pepineira em questão foi o discurso imbecil e desastrado, repleto de gaffes e partes gagas improvisadas a despropósito, do presidente da Câmara. É realmente impressionante como alguém, nitidamente despreparado, em discurso oficial e cerimónia solene, consegue na mesma frase chamar general ao marechal Norton de Matos, confundi-lo com Humberto Delgado, trocar 1949 por 58 e na frase seguinte, atribuir a paternidade do homenageado ao seu tio Severo Biscaia. 
É bem verdade que por mais que se encoste a um gigante, um anão nunca lhe tira o sol. Mas eu, que não tinha nada que ver com aquilo, senti-me envergonhado. Imagino como se sentiu a família. Há homenagens que são enxovalhos. Melo Biscaia merecia mais. Muito melhor.
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