Poeta
a poesia é uma máquina
de produzir entusiasmo
e é preciso que os versos sejam verdadeiros
na vida dos poetas
como a tua mão erguida
sobre os anos futuros
quando o próprio bronze das estátuas se cobrir
do verdete do esquecimento
e das urtigas
entre as ruínas de um passado morto
e as pequena plaquetes dos sentimentos pobres
dos líricos delírios
das doidas metáforas sem sentido
louvadas pela crítica só tiverem
o arqueólogo encanto de um cabelo de Ofélia...
Então
os teus versos estarão na primeira fila dos pioneiros
cobertos de cicatrizes
porque fizeram todo o caminho do tempo
multiplicados por milhões de vozes
pela alta potência dos alto-falantes
como uma bandeira erguida
sobre os anos futuros.
Joaquim
Namorado
Este
ano comemoram-se oitocentos anos da língua Portuguesa. Ah pois.
E quatrocentos
da primeira edição de “Peregrinação”, de Fernão Mendes Pinto.
E quarenta do vintecincodAbril, claro.
Os Correios de
Portugal não se esqueceram de nada disto e estão a tratar de o evocar,
convenientemente e como de costume, como aliás lhe compete, em belas edições
filatélicas.
Os
CTT também não se esqueceram dos cem anos do poeta (e matemático) Joaquim
Namorado e também lhe dedicaram um selo, integrado numa nova série dedicada a “vultos
da história e da cultura” nacionais.
.
Joaquim
Namorado - que cheguei a conhecer fugazmente (nas mesas do café Nau) e a quem
já evoquei aqui a propósito de outra coisa – é um poeta cuja relevância intelectual e estética (dirigiu durante anos
a revista Vértice e foi ele que cunhou uma das correntes literárias dominantes
no século vinte português) é tão iniludível como o seu testemunho de cidadania.
No entanto, além de poeta da incomodidade
e de “Aviso à navegação”, empenhado políticamente (até à militância), também
foi capaz da contenção, da ironia
profunda, da invenção e do arrojo formal de “Viagem ao país dos nefelibatas”.
A
Figueira chegou a ter um prémio literário com o seu nome, que o inenarrável Santana
Lopes aniquilou e o actual poder autárquico sucialista
substituiu pelo nome de João Gaspar Simões (nada contra, uma coisa não impede a
outra). Mas há mesmo uma petição ao presidente da Câmara com o objectivo de “recuperar
o prémio literário Joaquim Namorado”. Assine aqui,
-
porque a cidade da Figueira da Foz, onde o poeta se fixou, fundou um jornal,
foi eleito à assembleia municipal e residiu até á morte, nada. Isto de “vultos
da história e da cultura” é, convenhamos, algo que lhe passa ao lado (veja-se os
casos de Cândido Costa Pinto e de João César Monteiro).
.
A
verdade é que ou a cidade tem memória de peixe - as coisas passam-se-lhe – só uma cidade com a memória de uma chaputa (ou de uma
tremelga) se esquece dos seus maiores
- ou então o poeta da incomodidade ainda
incomoda. Mesmo depois de morto.
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1 comentário:
«Os tiranos não compreendem os poetas.
Quando os compreendem têm de os matar.»
Andreï Voznessenski
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