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sexta-feira, 10 de janeiro de 2014

Do humor e suas intenções

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O objectivo de uma piada não é degradar o ser humano, 
mas lembrar que ele já é degradado
 George Orwell
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“Analisar o humor, terá dito Elwyn Brooks White, um dos nomes mais antigos da revista “The New Yorker”, “é como dissecar uma rã. Poucas pessoas se mostram interessadas e no fim a rã morre”. A frase é certeira e não é difícil demonstrá-lo: nada tem menos graça do que ter de explicar uma graça.” (daqui)
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Vem isto a propósito de um curioso comentário ao meu boneco do Eusébio e, em termos mais gerais, a propósito das interpretações de um desenho que escapam às intenções do seu autor.
É preciso ressalvar que o desenho é uma convenção. Utiliza uma série de códigos mais ou menos estilizados que se tornam inteligíveis porque foram convencionados entre o artista e o público – por exemplo, dois simples traços curvos num papel sugerem uma ave no firmamento, um traço vertical encimado por um círculo pode sugerir uma árvore, etc. – as pessoas aceitam e entendem estes sinais embora saibam (pelo menos as mais inteligentes) que o mundo representado pelo desenho não é assim.
Isto ainda é mais verdade no desenho de humor, na caricatura. Aqui nada é, nunca, literal - nem o traço, nem a cor.
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As coisas escapam porém, amiúde, ao controle de quem as cria - a criatura ao criador, a arte ao artista. O significado último ou definitivo de uma obra não depende do seu criador, mas do observador. O ónus da interpretação cabe sempre a quem observa - à sua sensibilidade e mundivisão. Por vezes há tantas interpretações e significados quantos os observadores. Sobretudo em terrenos movediços como o da Arte (neste capítulo aliás, as obras de fascínio mais duradouro são aquelas que escapam a qualquer entendimento ou interpretação - como a Gioconda ou As Meninas ou qualquer coisa de Vermeer ou de di Chirico, por exemplo) ou como o do Humor, onde as obras mais fascinantes são aquelas cujo significado pode ter vários e simultâneos sentidos para o mesmo observador.
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A verdade é que, como diz o poeta Alberto Pimenta, “cada coisa pode ser o contrário do que é”, porque “a função das coisas é ser aquilo que se quer que elas sejam”.
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2 comentários:

Maria Eu disse...

O que seria da arte sem a diversidade de interpretações? :)

Andre Esteves disse...

O que era arte quando era uma obra de arte? Para se fazer obra é preciso ter arte. E quem dialogue a obra para fazer surgir a arte.

É a diferença entre os museus e a internet.

Obrigado pela obra. E pela arte.
Para a eternidade fica o diálogo de todos com a obra de arte.