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As coisas que um homem diz e as que faz dizem muito, por
vezes tudo, sobre a espessura do seu carácter, ou seja, sobre a substância de
que é feita a sua integridade, a essência do seu Ser mais profundo.
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Miguel Almeida acha que todos estamos condenados a obedecer a uma lei, mesmo iníqua. Que é uma
inevitabilidade; uma coisa assim a modos que definitiva, como a morte. E até
filosofa sobre isto e escreve-o nos jornais.
Eu sou de outra opinião.
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Eu penso que só um bandalho está condenado a obedecer a
uma lei iníqua. É evidente que uma tal lei também condena um homem decente, mas
apenas à desobediência.
Penso todavia que ser-se um bandalho não é uma
inevitabilidade, é uma escolha; uma questão de carácter. E de liberdade. De
livre-arbítrio, portanto. Também penso, por inerência, que a única
inevitabilidade que uma lei iníqua impõe a um homem decente é o imperativo da
sua revogação.
Mas não sou só eu que penso assim. Os redactores da
Constituição da República Portuguesa também o pensaram e até o consagraram, no
artigo 21º. Mas concedo que seja natural que, por ter sido eleito deputado pelo
pêpêdê tal como outros palermas, Miguel Almeida o desconheça.
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Miguel, tal como muitos outros do seu meio, é daqueles
cuja concepção de vida está alicerçada numa escala de valores balizada entre
dois sentidos únicos: mandar e obedecer. Toda a sua vida aliás se tem resumido
a isso mesmo, lamber cus enquanto espera a sua vez de, enfim, mandar fazê-lo a
outros (o que fará, certamente, assim que puder).
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Miguel Almeida pertence àquela estirpe de políticos que
acha que o facto de ter sido eleito pelo povo lhe dá um jenesécoá de distinto,
de sensato, de sábio, de equilibrado e que lhe concede a suprema graça das
musas filosofantes (deve ser por isso que assina merdas estultas nos jornais a
justificar os mais esconsos conchavos), mas não dá.
Existem aliás provas vivas
disso mesmo. O actual presidente da república, por exemplo, foi impune e
consecutivamente eleito pelo povo e no entanto continua a ser o que sempre foi:
um merdas, um bandalho (só um bandalho acharia lícito e normal beneficiar 140% num negócio em dois anos; um homem decente,
ao ser-lhe proposta tal trampolinice depreenderia logo que alguém ficaria a
lerpar outro tanto e chamaria a polícia). - Ou seja, um merdas será sempre um
merdas, sufragado ou não pelo voto. Isto sim é inevitável.
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No entanto, há algo no pensamento, digamos político, de
Miguel Almeida, que me enche de perplexidade: se para ele a obediência às leis "não é opção, é obrigação", e é "inevitável", como a morte, porque não age Miguel com esta em conformidade com o
seu, digamos, pensamento?
Dito de outro modo, se está condenado
a morrer (como todos nós helas)
porque não se mata já Miguel? Hum? Humm?...
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É claro que esta é uma pergunta retórica. Todos sabemos
que Miguel não levará a assertividade aos limites da coerência filosófica.
O mais certo é que Miguel Almeida não só não irá morrer
longe como é bem capaz de ser eleito pelo povo, aqui bem perto.
Miguel Almeida até pode fazer-se eleger presidente da república, como Cavaco.
Mas, tal como este, não deixará nunca de
ser o que sempre foi. É inevitável.
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