O Tribunal de Lisboa acaba de proibir a transmissão pela RTP de uma corrida de touros, decisão fundamentada na preocupação com a salvaguarda das criancinhas.
A partir de agora, touradas na TV, só a partir das 10.30h e com bolinha vermelha no canto superior direito!
Então, vai daí, o tribunal de Lisboa tomou uma decisão que, por exclusão de partes, cauciona todo o telelixo da programação das nossas estimadas televisões. Tudo é bom e nada prejudica as mentes influenciáveis das criancinhas. Tudo. Desde as manhãs da Fátima às tardes da Júlia; dos morangos com açúcar ao sórdido wrestling açucarado das tertúlias cor de rosa e às doutas e proféticas previsões do prof. Marcelo. Tudo.
Excepto as corridas de touros.
Suspeito mesmo que os fedelhos adeptos do car jacking, do bulling e até quiçá, do filhodaputing, sejam frenéticos aficcionados da Festa Brava e das Corridas televisadas!.
Eu quero que se danem a associação proanimal, a providência cautelar, o tribunal de Lisboa e a sua vara asinina que deliberou obrar tal iniquidade.
A corrida de touros é um jogo. O jogo mais antigo do homem. Um confronto entre o homem e o animal. Sem subterfúgios. Trata-se de um jogo limpo. Ali, o que está em jogo não é o que se pode ganhar mas sim o que se não pode perder. Não existem ali empates nem desforras nem conselhos jurídicos nem apitos nem recursos nem protestos… O que existe é uma noção de fatalidade inexorável. Mas também é um espectáculo e por tudo isto, creio que se trata de um espectáculo honesto.
No entanto, a sociedade do espectáculo não se conforma com espectáculos honestos, porque imprevisíveis. Gosta deles encenados, como o cinema, as entregas dos Óscares e os concursos de misses; ou simulados e com desfechos combinados, como o futebol. É mais tranquilizante.
Se a sensibilidade contemporânea não aprecia a verdade e a honestidade e prefere os simulacros é porque tolera mal a realidade e a consciência da fatalidade e da morte: o sentido trágico da vida.
Se a tourada “à Portuguesa“ já é, em si mesma, um triste simulacro, a mentalidade dos portugueses, muito permeável aos eufemismos do politicamente correcto, torna-se um campo aberto à aceitação de teorias bem intencionadas que pretendem preservar os meninos de todo o mal, potenciar neles uma espécie de estado de eterna inocência, fazê-los viver num eterno limbo, livres da consciência da fatalidade e dos factos da vida. Para esta nova espécie de seres humanos tudo o que lhes é permitido assistir é “a fingir”, nada pode ser real. Ficariam traumatizados.
Resta saber (e eu não sei se quero porque estou furioso) que espécie de mentalidade alienada e distorcida se está a tentar forjar nas jovens gerações, cobaias desta estranha e piedosa pedagogia.
Mas gosto de touros. A tauromaquia sempre foi um manancial para a arte. Pela cor, pela emoção, pelo movimento, pela paixão, pela fatalidade e por um especial acento gráfico em fortes contrastes estimulantes.
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Não, não sou sequer um aficcionado.
Não sou dessa tradição.
O meu amor aos touros é, digamos, platónico.
Gosto de os desenhar. Ao fazê-lo, gosto de pensar que sou capaz, por um instante, de encarnar, transfigurar e até sublimar uma profunda, visceral e atávica violência demolidora: a cornada.
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1 comentário:
Não concordando com a decisão judicial dque aqui é destacada queria dar uma cornada no assunto, salvo seja. Quanto ao mano-a- mano entre animais sou adepto das largadas e, não sendo monárquico, só gosto das pegas de forcados. Único espéctaculo tauromáquicos que aceito. O que sobra é divertimento de pseudo-aristocratas no qual o povo desempenha o papel de bobo da corte.
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