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Não, não é “uma bofetada no gosto do público” como usavam as vanguardas no início do século vinte. Nem uma qualquer boutade para “épater les bourgeois”…
Apeteceu-me acabar o ano com algo, digamos - bom.
Algo conceptual.
Uma obra que fosse como um retrato daquilo em que os burgueses (termo em desuso) gostam de se rever: uma imagem complacente, amável e bonita de si próprios:
Esta obra é dedicada a todos os artistas do país onde falta dinheiro em casa de quatro quintos das pessoas mas cuja elite adora e faz esgotar coisas bonitas - como sobretudos de caxemira a 4 mil euros ou caviar Beluga a 400€ cada 100 grs. Telemóveis “a mil e quinhentos euros (como o Nokia 8800 Sirocco Gold e modelos de nível idêntico) também desapareceram. E os de trinta mil euros não desapareceram porque nenhum vendedor os manda vir: afinal, quem pode comprar esse tipo de gadget mete-se no avião e vai a Londres abastecer-se.”
Aos artistas do país em que “arranjar mesa em certos restaurantes impõe tráfico de influências.” (que chic!)
Aos artistas que têm que fazer quotidianamente atençõezinhas aos novos burgueses desta elite tão sofisticada, que na sua estupidez ignorante e pretensiosa depreendem que o artista a quem querem adquirir uma obra deve viver como eles fizeram fortuna: de favores. Atençõezinhas.
Nota:
Claro que se o Comendador Joe (sim, o tal que estragou o natal à alta-finança)(!!), me quiser adquirir esta obra para expor no seu showroom, o preço é uma agradável surpresa. Mas eu faço uma atençãozinha (esta é uma das mais peculiares características dos hábitos sociais informais dos nossos burgueses, prometo que um dia destes lhe dedico um post).
A obra tem tudo para satisfazer o gosto sofisticado da elite supra citada: uma moldura antique, importada; uma tela de fino e exclusivo algodão importado e até a black ink indelével, um nanquim opaco e exclusivo foi igualmente importada da China profunda, via Londres, off course. Só a ideia (o conceito) é autóctone, o que contribui para a genuinidade da cor local.
Acrescento que esta obra original é autenticada e datada no verso, a crayon noir, com a firma do artista, o que lhe confere o carácter excelso das mais exclusivas criações.
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